26.09.2019 às 8h00
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Tenho leucemia. A minha herança africana não me deixa encontrar um dador de medula.” O apelo da alemã Astrid está a correr mundo. No sábado vai haver uma campanha de recolha de sangue e registo de dadores de medula óssea em Lisboa
Sara Rodrigues
Jornalista
Astrid tem 42 anos, vive em Frankfurt, na Alemanha, e uma doença que depende da ajuda de outra pessoa. Precisa com urgência de um transplante de medula óssea.
Desde janeiro, altura em que os médicos chegaram à conclusão que as sessões de quimioterapia não estavam a resultar, que os seus familiares e amigos andam a correr mundo para encontrar um dador compatível para reverter a leucemia mieloide aguda de Astrid.
O facto de ter origem multi-étnica (pai nigeriano e mãe alemã) tem transformado esta busca naquilo que se costuma apelidar de "procurar uma agulha num palheiro".
A origem étnica tem um papel fundamental nas doações de células estaminais. Para haver o que se costuma designar de match (pessoa compatível com outra, podendo ser a dadora) tem de existir a mesma herança genética. E o problema é ainda mais complicado quando há genes mistos, como é o caso de Astrid, já que apenas 3% dos dadores registados são multi-étnicos.
Haver um dador compatível é mais difícil para as pessoas que não são brancas, já que, dos mais de 35 milhões de dadores que existem no mundo, 95% são caucasianos e a sua constituição genética é diferente de um indivíduo negro ou oriental.
Depois de verificar, a nível mundial, que não existia ninguém compatível registado e que os dadores multi-étnicos eram uma pequena minoria, a família e os amigos lançaram-se numa corrida mundial para a ajudar, mas também para alertar para a diminuta lista de pessoas de origem africana ou com genes mistos.
Astrid ao colo do pai
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Foi lançada uma campanha internacional denominada #MatchMyMix! (com presença em todas as redes sociais) e o site Help Astrid “Se um dos teus progenitores for da África Ocidental, de preferência da Nigéria e do grupo étnico Ibo/Igbo, e o outro progenitor for europeu podes salvar a minha vida através de uma doação de células”, apela-se.
Já foram feitas algumas dezenas de colheitas na Alemanha, Nigéria, Gana, Reino Unido e EUA.
No sábado, dia 28 de setembro, é a vez de Portugal. Em dois locais diferentes de Lisboa: o Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST) vai recolher sangue e fazer o registo para dadores de medula nas instalações da Igreja de Santa Isabel, na Rua Saraiva de Carvalho, 2A, entre as 9 horas e as 13 horas; o outro local, também com organização do IPST, é o Hospital Júlio de Matos, Avenida do Brasil 53, Pavilhão 17, entre as 8 horas e as 19 horas.
Cartaz da campanha mundial
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“Ela não vai sobreviver se não fizer o transplante de medula”, diz, à VISÃO, Judy Asamoah, a amiga de Astrid, residente em Lisboa há vários anos, responsável pela campanha de apelo em Portugal. “Agora está a fazer um tratamento para a manter estável, mas só um transplante a pode salvar.”
E porquê Portugal? Os amigos e familiares chegaram à conclusão que “existe uma variedade muito grande de pessoas com heranças multi-étnicas devido ao passado do país”, nota Judy, que aliás, acrescenta, “a mistura genética aqui é muito mais interessante do que a da Alemanha”.
A recolha, a cargo do IPST, vai decorrer durante todo o dia com uma equipa preparada para receber as amostras de sangue e os registos para dadores de medula.
Em Portugal, segundo números fornecidos pelo IPST, há 403 832 dadores registados e a grande maioria, embora não haja valores certos, é que 95% dos inscritos sejam caucasianos.
Maria Antónia Escoval, presidente do Conselho Diretivo do IPST, em reposta por e-mail à VISÃO, aponta para a emotividade que casos particulares possam causar e apela a que “os dadores se inscrevam com serenidade e por decisão própria” e “após total esclarecimento sobre o processo, até à dádiva e após esta”.
A especialista diz que, perante o número de dadores já existentes e “a diversidade genética já representada, não há urgência em colher mais mil ou dois mil dadores” nesta ação. Por experiência, refere que “iniciativas deste género, na sua maioria, apenas ajudam a introduzir dadores geneticamente idênticos aos já existentes”. “Não será nesse grupo que vamos encontrar um dador específico para um doente se ele não existir já em mais de 35 milhões.”
Aliás, e a curto prazo, será o Centro Nacional de Dadores de Células de Medula Óssea, Estaminais ou de Sangue do Cordão (CEDACE) “a determinar quando e onde pretende colher, com base em estudos que permitem identificar as regiões onde ainda é possível aumentar mais a diversidade genética, e assim ajudar mais doentes”, diz Maria Antónia Escoval.
Astrid soube que tinha leucemia mieloide aguda – cancro raro e agressivo do sangue e da medula óssea que interfere no desenvolvimento de células sanguíneas saudáveis – em setembro de 2018.
Fez tratamentos de quimioterapia que começaram por dar alguma esperança aos médicos, mas que durou pouco. Em janeiro “ficou claro que a única hipótese de vencer o cancro seria através de um transplante de medula”, escreveu a alemã no seu site.
Com dois filhos, de 9 e 12 anos, ela, o marido, Florian (que está numa cadeira de rodas devido a um acidente de moto em 2014), e os amigos juntaram-se para esta campanha mundial que, esperam, venha a ter resultados rápidos.
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