sábado, 4 de junho de 2016

A LEGITIMAÇÃO DA OPRESSÃO

 Rui Peralta, Luanda 

O discurso dominante na economia-mundo apresenta a globalização como um fenómeno novo vinculado às transformações tecnológicas, como uma nova fase, esquecendo que o processo de mundialização é anterior ao capitalismo e que este afirmou-se em paralelo com os processos de transformação técnica e tecnológica, em paralelo com a mundialização. O capitalismo afirmou-se como estrutura dominante na economia-mundo apenas no último terço do século XIX, manifestando o seu domínio através da partilha colonial. Mas esta dimensão mundial encontra-se desde a sua origem, desde as suas primeiras manifestações, e torna-se uma constante no seu desenvolvimento.

Os elementos essenciais do capitalismo como estrutura dominante cristalizam-se na Europa desde o Renascimento (finais do século XV) com a chegada ao Novo Mundo. O saque, a escravatura, a destruturação das sociedades locais e a destruição das civilizações ameríndias e africanas foram condições para a afirmação do capitalismo como modo de produção dominante nas sociedades europeias. A colonização não foi senão o processo de generalização das relações capitalistas no resto do mundo, a forma de domínio politico que foi exportado e imposto. Foi, assim, imperiosa a destruição das relações sociais e das formas de organização social e cultural dos povos colonizados.

O racismo biológico aparece como forma de legitimação da violência empregue nos processos de colonização, uma ideologia da hierarquização da humanidade e é uma produção localizada histórica e geograficamente na Europa (no tempo e no espaço europeu, no contexto europeu), onde o capitalismo emergiu. Este primeiro rosto histórico do racismo conhece a sua idade do ouro no século XIX, entre a grande explosão industrial, por um lado, e a partilha colonial, por outro.

Médicos e antropólogos classificavam crânios humanos e comparavam-nos, concluindo que a capacidade craniana dos povos africanos estava abaixo do europeu e acima dos povos da Austrália e Oceânia e que a pequenez relativa do cérebro da mulher depende da sua inferioridade física e intelectual. Racismo biológico e sexismo nascem juntos e são mecanismos de afirmação de Poder. O “fardo do homem branco”, mito da colonização, é retirado do mesmo arsenal ideológico do “chefe de família”, necessidade da alteração da estrutura familiar (para cumprir os novos horários da industrialização) e das suas implicações na estrutura patriarcal de Poder.

Do racismo biológico evoluiu-se para o racismo cultural, o que implicou outras alterações nas formas de domínio sobre a periferia, passando-se do colonialismo para o neocolonialismo. Os elementos essenciais sofreram mutações mas mantiveram-se como elementos essenciais. O mesmo se passa na actualidade. Mantêm-se os elementos principais de domínio, apesar das mutações observadas (do racismo cultural passou-se ao apartheid social generalizado), continuando o saque sobre os recursos e aprimorando-se a destruturação como elemento principal do domínio sobre a periferia.

Todas as formas de domínio requerem processos de legitimação. Hoje, estão lançados, novos processos, sendo um deles - o fundamental - a legitimação da brutal concentração de riqueza que atira a humanidade para a precariedade…

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