sábado, 20 de janeiro de 2018

“Comer cápsulas é estúpido”. INEM e PSP explicam porquê (e sim, tornou-se necessário explicar)

“Não faz sen(Tide)”, diz a PSP. "Come bolachas", sugere o INEM. O novo desafio na Internet é a ingestão (ou “apenas” a colocação na boca) de cápsulas de detergente concentrado. O objetivo é ganhar fama nas redes sociais, mas as consequências podem ser graves.

Depois da canela, dos baldes gelados, das camadas de maquilhagem e dos sais de banho, eis que as atenções dos nativos digitais (os adolescentes) se viram para a lide doméstica. A moda agora é trincar pastilhas de detergente.
É o chamado “Tide pod challenge” ou desafio das pastilhas Tide. O objetivo é morder uma cápsula de detergente líquido. Mais do que morder, há quem cozinhe, faça massa ou pizza com guarnição de cápsulas de detergente concentrado.
Ao SAPO24, o Centro de Informação Antivenenos (CIAV) do INEM diz que, em Portugal, “não há relatos, nem o INEM recebeu qualquer pedido de ajuda através do CIAV, para situações de ingestão voluntária de cápsulas de detergente”. E sublinha que os dados de que dispõe "dizem respeito a escalões etários mais baixos e decorrem de situações acidentais”, remetendo para um comunicado divulgado pelo instituto no final do ano passado.
Mas nos Estados Unidos, de onde o "desafio" parece ter tido origem, só este ano, houve 37 casos de ingestão destas cápsulas, metade das quais foi intencional, escreve o 'Washington Post'.
Dose concentrada, riscos concentrados
No documento, de 30 de novembro, o INEM explica que “as cápsulas de utilização unitária de detergente para lavagem de roupa ou loiça contêm entre 30 a 50 ml de um detergente concentrado, revestidas por um invólucro solúvel em água”. Chama ainda a atenção para as “cores brilhantes e chamativas”, que “são particularmente atrativas para as crianças que as podem confundir com guloseimas, rebuçados ou doces”.
Neste desafio, porém, não há confusão. A ingestão é voluntária. E por causa disso, tanto a PSP como o Serviço Nacional de Saúde (SNS) divulgaram por estes dias comunicados a alertar para este desafio, recordando que “esta prática é extremamente perigosa podendo causar lesões graves”.
Nos últimos anos, passou a ser comum a oferta de detergentes sob a fórmula de cápsulas. A par da banalização do uso dessa forma de apresentação, aumentaram igualmente o número de intoxicações, que espoletam chamadas para o Centro de Informação Antivenenos. Fátima Rato, médica responsável pelo CIAV diz que estas intoxicações resultam, na maioria dos casos “do seu manuseamento pelas crianças, que ao rebentarem as cápsulas nas mãos ou na boca, atingem os olhos, a boca e a pele”.
No primeiro trimestre do ano passado, houve 41 casos de exposição a detergente em cápsulas envolvendo crianças até aos 10 anos de idade. Comparando os dados de todo o ano de 2015 com o período homólogo de 2016, vemos uma diminuição, caindo dos 140 para os 115 casos, respetivamente. A maioria destes casos - acidentais - ocorre com crianças, com particular incidência nos menores de 2 anos.
No comunicado do INEM, são também explicadas as consequências. “Consoante o órgão atingido pelo contacto direto com o produto”, variam as alterações e lesões  provocadas. Assim, em caso de contacto com a pele, o líquido destas cápsulas pode causar eritema, que se manifesta com pele vermelha e irritada.
Em caso de contacto com os olhos, há “ardor, olho vermelho, edema (inchaço) palpebral ou mesmo uma queimadura física”. Já no que diz respeito ao contacto com a boca, por ventura o mais comum neste “desafio”, verificam-se vómitos, alterações na orofaringe (garganta), ou alterações respiratórias caso haja aspiração do produto.
Não é boa ideia
As pastilhas servem para pôr na máquina da loiça ou da roupa. Só isso. Esta é a garantia que a própria marca vem reforçar.
“Para que devem ser usadas as cápsulas Tide? LAVAR A ROUPA. Nada mais. Comer uma cápsula de Tide é uma MÁ IDEIA, e pedimos ao nosso amigo @robgronkowski para nos ajudar a explicá-lo”, pode ler-se na mensagem divulgada pela marca na rede social Twitter.
Também a Procter & Gamble, que detém a marca de detergentes, disse já em comunicado estar “profundamente preocupada com as conversas relacionadas com o uso intencional e impróprio das cápsulas de detergente”, sublinhado que são feitas unicamente “para lavar a roupa”.
Petra Renck, porta-voz da empresa, acrescenta que as cápsulas não devem ser utilizadas em qualquer brincadeira, devendo sempre ser manuseadas “corretamente e armazenadas em segurança”.
É também com humor que o próprio INEM alerta, nas redes sociais, para os perigos deste desafio.
Na rede social Twitter, o instituto diz que “comer cápsulas é estúpido” e sugere aos interessados na ingestão de qualquer coisa que comam antes bolachas.
YouTube combate vídeos que mostrem pessoas a comer detergente
A plataforma YouTube, uma rede de partilha de vídeos, anunciou que está a eliminar vídeos de pessoas a ingerir cápsulas de detergente.
“As regras da comunidade YouTube proíbem conteúdo que tenha a intenção de encorajar atividades perigosas que tenham um risco inerente de danos físicos. Estamos a trabalhar para rapidamente remover os vídeos sinalizados que violam as nossas políticas, disse um porta-voz daquela plataforma, detida pela Google, citada pelo jornal britânico ‘Guardian’.
O que fazer caso alguém decida comer detergente em vez de bolachas?
Caso haja contacto com este tipo de produto, sublinha o INEM, deve fazer-se uma lavagem abundante com água corrente, “nomeadamente no caso de contacto por via ocular, em que a lavagem deve ser feita durante 10 a 15 minutos, afastando as pálpebras”. Deve seguidamente ligar-se para o CIAV através do número 808 250 143.
Os médicos deste Centro de Informação Toxicológica do INEM “estão preparados para facultar todas as indicações relativamente aos procedimentos a adotar e à eventual necessidade de observação numa Unidade de Saúde”, refere a responsável do serviço. Este serviço do INEM funciona 24 horas por dia, todos os dias do ano.
"Estão disponíveis vários estudos realizados tanto na Europa como nos EUA que retratam esta realidade”, explica o INEM. “Em Portugal, os casos que chegam ao conhecimento do CIAV acompanham o padrão verificado noutros países nomeadamente no tipo de exposições ao produto, envolvimento de crianças de idades mais baixas e no tipo e gravidade das lesões que determinam”, acrescenta.
sapo

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