Na passada terça-feira, tal como foi público, terminou o prazo para qualquer pessoa ou entidade avaliar o Estudo de Impacte Ambiental da proposta de construção de cinco enormes unidades de criação de frangos, na zona do Seixo, norte do concelho de Mira, vizinha da região sul do concelho de Vagos.
Em resumo, e para que se compreenda a intervenção de acompanhamento da situação por parte da Quercus, trata-se de investir num projeto megalómano para que num espaço de 200 hectares de terras agrícolas e florestais nasça uma zona industrial. Essa zona industrial acolherá 5 unidades de produção, cada uma delas com 3 gigantes aviários, num total de 15 aviários e de todos os equipamentos e vias necessários para o seu funcionamento. Logo aqui há que mostrar estranheza pelo facto de se permitir que unidades industriais venham destruir e ocupar ainda mais terrenos que deveriam ser uma área de proteção de Reserva Agrícola e Reserva Ecológica Nacional.
Para que se tenha uma pequena ideia dos problemas que poderá levantar este aviário gigante, basta comparar o número de animais que vão ser “produzidos” anualmente, cerca de 2 milhões e 670 mil frangos, com um equivalente científico que equiparando os mesmos com bovinos (CN) equivale a cerca de 16 mil vacas. Imaginem um grande campo de futebol (onde normalmente se defrontam 22 jogadores) com 80 vacas, e depois multiplique-se por 200. E agora imagine-se a enorme quantidade de comida que é preciso transportar para o local, sabendo que nesses 200 hectares não se vai cultivar um único grão de milho.
Neste Estudo de Impacte Ambiental foram detetadas várias fragilidades, inúmeras situações em que se tenta mascarar aquilo que se irá passar em termos reais se o projeto for avante. São disso exemplos: os problemas ligados à recolha e transporte dos resíduos sólidos resultantes, e também qual o seu destino final; o destino final dos efluentes líquidos, recolhidos em fossas que deverão ser estanques; a falta de estudos credíveis sobre a exagerada utilização de água captada no subsolo e influência nos níveis freáticos; a poluição do ar, derivado das caldeiras de queima de matérias orgânicas para aquecimento dos pavilhões; a intensidade dos maus cheiros e poeiras resultantes das operações diárias, bem como a identificação das populações mais afetadas; a poluição sonora e do ar resultante do aumento impressionante de veículos pesados a circular nas estradas.
Sem reflexo no Estudo de Impacte Ambiental há ainda razões que importa referir, no sentido de avaliar um empreendimento desta natureza. Os grandes lucros associados a uma exploração intensiva e concentrada territorialmente é algo do passado e o caminho para um desenvolvimento harmonioso do território já não passa por estas receitas. Toda a carne produzida industrialmente e consumida de forma regular está ligada a graves distúrbios na saúde humana, para não falar na cada vez maior necessidade de se atentar às condições de criação dos frangos. A sociedade está já a reagir com o vegetarianismo, e ainda mais drasticamente com o veganismo. Era importante avaliar se uma receita de desenvolvimento baseada no apoio a pequenos produtores de frangos de qualidade, de forma mais dispersa pelo concelho de Mira, não teria melhores resultados sociais e ambientais do que esta aposta megalómana, com profundos impactos negativos naquilo que são atividades de um concelho, que dada a sua situação geográfica e riquezas naturais, poderia ter uma imagem de grande qualidade turística e de produção de alimentos.
O Núcleo de Aveiro da Quercus, na sequência das participações neste processo de consulta pública, espera que não seja efetuada a alteração do Plano Diretor Municipal de Mira e da carta da Reserva Ecológica Nacional, pelo que apela não só à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro para uma intervenção inteligente e independente de interesses privados em defesa do ordenamento do território, como apela à Agência Portuguesa do Ambiente para não aprovar este Estudo de Impacte Ambiental para a “Instalação Avícola da Quinta do Seixo”.
Aveiro, 13 de Setembro de 2018
A Direção Regional de Aveiro da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza
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