Parecer de investigadora que avaliou sedimentos no fundo do Sado pede "estudo aprofundado" dos riscos das anunciadas dragagens em Setúbal.
Imagine um copo com algum tipo de pó. Durante anos ou décadas o pó pode ficar quieto no fundo, mas se agitarmos uma colher o pó vai espalhar-se por toda a água.
No Estuário do Sado a ideia não é pegar numa colher, mas retirar milhões de metros cúbicos de areia de um lado e colocá-los no outro para abrir o canal à entrada de navios maiores no Porto de Setúbal.
O problema, explica Sandra Caeiro, investigadora que participou numa dezena de estudos sobre contaminações em sedimentos de estuários, nomeadamente no Sado, é que no caso deste rio algumas das zonas onde se preveem as dragagens estão contaminadas com metais como zinco, cobre, crómio e chumbo, além de pesticidas e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos com "efeitos adversos em organismos vivos amplamente estudados". É a chamada herança ambiental pesada por décadas de exploração industrial da região.
Os inúmeros estudos da investigadora do Departamento de Ciências e Tecnologia da Universidade Aberta e do Centro de Investigação em Sustentabilidade Ambiental da Universidade Nova levaram a plataforma SOS Sado a contactá-la e a pedir um parecer.
O parecer com data de 15 de novembro, a que a TSF teve acesso, vai de encontro às preocupações do movimento cívico que tem contestado as dragagens para aumentar a capacidade do porto de Setúbal.
Sandra Caeiro dá o exemplo da comunidade piscatória da aldeia da Carrasqueira, no Sul do estuário. Num estudo recente que fez com mais nove investigadores, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, Sandra Caeiro detetou uma maior tendência nesta população, com muito contacto com o rio, para doenças crónicas e degenerativas.
A investigadora sublinha que estas doenças não se notam logo e demoram anos a dar sinais no corpo humano.
As dragagens previstas para Setúbal irão mexer em zonas perto de actuais e antigas indústrias com contaminações de décadas no fundo, levando as areias, depois, para fora do estuário, não muito longe das praias da Serra da Arrábida e de Tróia.
Em conclusão, o parecer de Sandra Caeiro afirma que "em caso de mobilização do fundo do estuário do Sado existe a probabilidade dos sedimentos existentes no canal norte ocasionarem efeitos adversos nos ecossistemas e na saúde humana. Desta forma, recomenda-se que em atividades de dragagem e eliminação deva ser previamente efetuado um estudo aprofundado do risco ambiental desses sedimentos nos ecossistemas e na saúde humana" e "das características do eventual local de deposição e monitorização posterior do mesmo".
Recorde-se que a imersão das areias dragadas no Sado e entrada do estuário estiveram em consulta pública até 29 de outubro, aguardando-se uma decisão sobre a sua viabilidade ambiental.
Fonte TSF
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