terça-feira, 8 de outubro de 2019

Mundo | Fossilização das sociedades comunistas




Péricles Capanema

Faz falta clareza solar a respeito da relação entre sociedades fósseis e comunismo. Em ampla proporção o comunismo caiu na Europa Oriental pela paradeira prevalente em grandes faixas do público. O sistema gestava estagnação, difundia o torpor, causava sensação de imobilidade. Em especial, socava goela abaixo letargia e fechamento de horizontes pessoais para a juventude e para os setores mais talentosos do público, enquistados em todas as faixas, desde o operariado até as camadas letradas. Fossilizados os regimes, na decomposição, aquilo explodiu como um cadáver apodrecido. Uma vez mais, a utopia, cega à natureza humana, gerou o desastre. Outro título possível para o artigo: A fossilização das sociedades igualitárias. Ainda: A fossilização das sociedades coletivistas. No caso, é a mesma coisa, igualitarismo, coletivismo, comunismo. Horizontes fechados, poucas aspirações, pouco consumo, o atraso levando à involução.
É o que oferecem ainda hoje os petistas ao Brasil, petrificados na utopia perversa, desde os mais radicalizados até os proclamados moderados e setores que são seus companheiros de viagem ou inocentes úteis. De outro modo, suas iscas na realidade acarretarão a fossilização, por via rápida ou gradual. Lembra a velha disputa entre jacobinos, os radicais, e girondinos, os moderados, na Revolução Francesa.
O petista Rui Costa [foto], reeleito governador da Bahia, tenta agora tornar viável a amarga receita tóxica, que vem envenenando povos há mais de século, girondinamente colocando nela água e açúcar. Em entrevista à Veja (Páginas Amarelas, 18-9-19) dá o tom da política que espera vencedora: “O certo era ter apoiado o Ciro Gomes lá atrás. Nenhuma outra liderança teria condições de superar o antipetismo”. Contudo, o político soteropolitano continua namorando o chavismo, disparado na via jacobina: “Assim como considero um exagero dizer que o Brasil é uma ditadura, não tenho elementos para classificar a Venezuela dessa forma”.
Rui Costa vem afivelando bem a máscara do moderado, com ela espera desfilar a partir de agora na Sapucaí da política. E não está só, vários outros dirigentes do PT apostam no mesmo recurso, como entre outros, Jaques Wagner e Camilo Santana. De começo, para não parecer um dinossauro, evita propor estatização, menina de olhos da esquerda: “O cenário mundial mudou. É preciso um novo olhar sobre gestão pública. Nos governos petistas, sistemas de água e esgoto foram financiados pela União. Não é possível replicar isso hoje. Devemos abrir os horizontes. Na Bahia, por exemplo, eu já tenho uma política para atrair negócios em parcerias público-privadas”.
Quem diria, um petista proclamando que estatização é para gente de horizontes acanhados. Tem razão, ainda que tardia, é para quem favorece atrofia nas personalidades, anemia na economia e fossilização social. Só que antes não se sentiam obrigados a exprimir o óbvio.
Finalmente, o governador baiano avisa que, postas certas condições, não recusaria candidatura presidencial em 2022: “Hoje, quero construir com outras lideranças essa alternativa [um projeto de país, seja lá o que isso possa significar]. Mas é óbvio que, se digo que estou disposto a construir algo, então estou disposto a assumir qualquer tarefa”.
Espumou imediatamente a Comissão Nacional Executiva do PT, para Rui Costa atitude conveniente, pois consolida sua imagem de moderado. Respigo dois pontos da nota: “O eventual apoio do PT a Ciro Gomes, se à época já não se justificava porque nunca foi intenção dele constituir uma alternativa no campo da centro-esquerda, hoje menos ainda, dado que ele escancara opiniões grosseiras e desrespeitosas sobre Lula, o PT e nossas lideranças”. Continua o órgão dirigente petista defendendo Nicolás Maduro: “Nossa visão sobre a Venezuela considera primeiramente que o país vizinho se encontra sob criminoso embargo econômico e tentativa de intervenção militar estadunidense (com apoio do governo Bolsonaro), o que denunciamos em todos os fóruns”. O PT, petrificado, ORCRIM em tantos episódios recentes nossa história, porta-bandeira ufano do atraso, sonha dia e noite em impor o bolivarianismo.
Pela via girondina, com a hoje provável vitória kirchnerista, a Argentina será gradualmente empurrada rumo à situação venezuelana. Estamos imunes a tal quadro? Óbvio, não. A volta do PT ao Planalto, por meio de suas alas jacobinas ou girondinas, é a ameaça mais próxima de fossilização social para o Brasil, no que terá apoio entusiástico da CNBB, CPT, MST e forças afins. No exterior, virão apoios da China e da Rússia, que já vêm sustentando a tirania chavista. E aí, fuga de capitais, consumo em frangalhos e generalização da miséria.
Tal ameaça é potencializada pelo mantra generalizado de que é preciso diminuir as desigualdades sociais no Brasil. De acordo, é política saudável, necessária e urgente, desde que colocadas certas premissas. Como tais balizas quase nunca são colocadas, o mantra na prática bafeja a fossilização.
Para que a sociedade tenha igualdade proporcionada (lembro Aristóteles) ou, se quisermos, desigualdades harmônicas, é mais urgente hoje favorecer a plenitude, sinônimo de vida. Estimular as potencialidades da vida em todos os âmbitos, moral, institucional, econômico. E com isso, pela mais ampla aplicação do princípio da subsidiariedade, fortalecer a sociedade em relação ao Estado. Um choque de fundo perpassa o Brasil, plenitude versus atrofia. A aplicação das receitas comunistas, puras ou em solução diluidora, inibe o impulso rumo à perfeição, que é a atração pela plenitude.
Meses atrás publiquei livrinho de contos sob o título “Brigo pelos homens atrofiados”, utilizando o pseudônimo Zeca Patafufo, que tratava desse tema. Na historinha, o personagem Adamastor Ferrão Bravo advertia figuras do governo dos Estados Unidos, desenhando ampla visão de conjunto, da qual retiro o seguinte e já peço perdão pela extensão do texto:
“O coletivismo cobra seu preço. Mesmo nos Estados Unidos seu perigo é maior que o do individualismo. Se estourarem guerras ou crises econômicas com recessão prolongada, aos olhos do público, o consumo, dado por excessivo, poderá ser restringido drasticamente por pilhas de medidas autoritárias; outro motivo para restrições, a degradação ambiental, que estaria atingindo níveis intoleráveis. E, então seria mais que normal para uma montoeira de gente, alegado o estado de necessidade, desrespeitar individualidades e, congruente, frear o desenvolvimento e, com isso, ficará forçoso rifar liberdades hoje existentes — espaços de oportunidade e crescimento pessoal —, confrangimentos impostos até mesmo por autoridade mundial. Será meio de cultivo para correntes atreladas a ideias românticas da vida tribal, adeptas do pouco consumo, que de momento fazem a cabeça quase tão-só de pessoas do mundo universitário. Decrescimento e crescimento negativo viraram ali conceitos na moda. Essa batelada de disparates pavimenta a rota do apagão do homem”.
O que a torna viável o apagão? As sociedades fósseis.

ABIM

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