Milhares nas ruas pedem democracia e libertação de Liu Xiaobo
01 de Julho de 2017, 23:48
Hong Kong, China, 01 jul (Lusa) -- Milhares de pessoas saíram hoje à rua em Hong Kong, para pedir mais liberdades políticas e a libertação do ativista chinês Liu Xiaobo, no dia do vigésimo aniversário da transição da antiga colónia britânica para a China.
A Civil Human Rigthts Front [Frente Civil dos Direitos Humanos], que todos os anos organiza o protesto de 01 de julho, estimou o número de participantes em mais de 60.000, enquanto a polícia referiu 14.500, segundo a imprensa local.
Os números foram inferiores aos do ano passado, com a organização a estimar cerca de 110.000 participantes e a polícia 19.300.
A marcha saiu do Parque Vitória em direção ao Conselho Legislativo (LegCo, o parlamento) pelas 15:00 (08:00 em Lisboa), já depois de o Presidente chinês, Xi Jinping, ter deixado a cidade, no final de uma visita de três dias, marcada por detenções de ativistas em protestos e pela advertência de que não será tolerada qualquer ameaça contra o poder de Pequim.
"Penso que todos os que vieram à manifestação vieram porque pensam que este ano é muito especial: são os 20 anos desde a transição", disse à agência Lusa Au Nok-hin, da Frente Civil dos Direitos Humanos, a entidade que organiza a manifestação.
"Há muitos problemas por resolver por parte do Governo de Hong Kong", acrescentou o também membro do Partido Democrata.
Nesse sentido, Au Nok-hin criticou as declarações do porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, que na sexta-feira disse que a Declaração Conjunta sino-britânica -- assinada em 1984 e na qual assenta o princípio "Um país, dois sistemas" e ao abrigo do qual foi realizada a transição de Hong Kong para a China em 1997 --, "é um documento histórico e não tem qualquer significado prático".
O mesmo responsável disse que esperava que o Governo central reconsiderasse as declarações daquele ministério.
"Muitos de nós estão preocupados com o futuro de Hong Kong, sobretudo com as recentes limitações à liberdade de reunião", acrescentou, em alusão às restrições impostas pela polícia para os protestos dos ativistas durante a visita de Xi Jinping à cidade.
No protesto marcaram também presença os ativistas que esta manhã foram detidos pela polícia, incluindo o rosto dos protestos pró-democracia de 2014, o jovem Joshua Wong e o deputado conhecido como 'Cabelo Comprido'.
Este ano, os manifestantes viram reduzido o espaço que anualmente lhes é atribuído no Parque Vitória, de onde parte a tradicional marcha pró-democracia, uma vez que grande parte da área estava reservada a uma exposição promovida por uma coligação de grupos de cerca de 40 grupos pró-Pequim (Hong Kong Celebrations Association).
Antes de iniciarem a marcha pelas ruas, no palco montado sobre o relvado do parque, vários ativistas usaram da palavra, incluindo Lam Wing-kee, um dos cinco livreiros que em 2015 desapareceram em condições misteriosas para reaparecerem, mais tarde, detidos na China e a confessarem crimes através da televisão estatal chinesa.
Lam Wing-kee pediu a libertação de Liu Xiaobo e apelou aos manifestantes para não desistirem de lutar pela democracia.
Liu Xiaobo, de 61 anos, que em 2010 foi distinguido com o prémio Nobel da Paz por promover a reforma política da China, viu esta semana ser-lhe concedida liberdade condicional depois de lhe ter sido diagnosticado um cancro no fígado em fase terminal.
O ativista foi condenado em 2009 a 11 anos de reclusão por subversão.
O protesto decorreu de forma pacífica, sob calor intenso e alguns períodos debaixo de chuva intensa, com os manifestantes a percorrerem cerca de três quilómetros entre o Parque Vitória do LegCo, durante mais de três horas.
Os manifestantes reclamaram também uma ação legal contra o ex-chefe do executivo CY Leung, por pagamentos recebidos da empresa de engenharia australiana UGL enquanto líder da cidade, o desenvolvimento sustentável da cidade, a defesa dos direitos dos homossexuais e da diversidade étnica.
O protesto, dominado por guarda-chuvas amarelos e outros símbolos pró-democracia, contou com defensores pró-independência da cidade, que apareceram em alguns cruzamentos por onde a marcha passava com bandeiras a remeter para os tempos da colónia britânica.
A chuva acabou por levar a organização a cancelar uma concentração prevista no Tamar Park, onde estão situados o LegCo e a sede do Governo do território.
As manifestações pró-democracia são realizadas anualmente desde 01 de julho de 1997 e atingiram uma dimensão significativa desde 2003, quando meio milhão de pessoas saiu em protesto contra o plano do governo de regulamentar o artigo 23.º da Lei Básica, que prevê punir crimes de traição à pátria, secessão e subversão.
FV // VM
Pequim vai garantir aplicação firme de "um país, dois sistemas" em Hong Kong
01 de Julho de 2017, 12:58
Hong Kong, China, 01 jul (Lusa) - O Presidente chinês sublinhou hoje que Pequim vai garantir a aplicação "com firmeza" do princípio "um país, dois sistemas" em Hong Kong.
O Governo de Hong Kong "deve manter-se fiel a esta direção e respeitar integralmente" aquele princípio, afirmou Xi Jinping, perante mais de dois mil convidados que assistiram, momentos antes, à cerimónia de posse da chefe do Executivo, Carrie Lam, primeira mulher a desempenhar o cargo.
Este conceito foi criado para defender a unidade do país e qualquer desafio à soberania ou apoio à oposição representa uma rutura do princípio "um país, dois sistemas", acrescentou.
"Qualquer tentativa que ponha em perigo a soberania e segurança da China, desafie o poder do Governo central e a autoridade da Lei Básica de Hong Kong (...) é absolutamente inadmissível", declarou.
O respeito e aplicação do princípio "um país, dois sistemas" responde às necessidades da população de Hong Kong, de manter a prosperidade e estabilidade de Hong Kong, serve os interesses fundamentais da nação e as aspirações partilhadas de todos os chineses, disse, de acordo com a agência noticiosa chinesa Xinhua.
Mas o Governo de Hong Kong deve fazer mais para responder aos desafios colocados pela economia, habitação, segurança e aumentar a educação patriótica, considerou.
Xi Jinping ofereceu a ajuda e força económica da China como "uma oportunidade" para revitalizar Hong Kong, numa altura em que o preço das habitações é incomportável para os residentes e a competitividade internacional do território diminuiu.
"Criar deliberadamente divergências políticas e provocar a confrontação não vai resolver os problemas. Pelo contrário, só vai impedir gravemente o desenvolvimento económico e social de Hong Kong", advertiu.
Antes, Carrie Lam, de 60 anos, e os seus secretários juraram servir a China e Hong Kong e respeitar a Lei Básica, a miniconstituição do território.
O Presidente chinês chegou na quinta-feira a Hong Kong para as cerimónias do 20.º aniversário da transferência de soberania do Reino Unido para a China - 01 de julho de 1997 - e para investir a nova chefe do Executivo da Região Administrativa especial chinesa.
A cerca de um quilómetro de distância, um pequeno grupo de ativistas pró-democracia confrontou-se com a polícia e manifestantes pró-China. Pelo menos nove militantes pró-democracia foram detidos, indicou a agência noticiosa espanhola Efe.
EJ // DM
Ativistas condenam "abuso de poder" da polícia após libertação
01 de Julho de 2017, 15:21
Hong Kong, China, 01 jul (Lusa) -- Ativistas pró-democracia, detidos hoje em Honk Kong e libertados pouco tempo depois, condenaram a atuação da polícia, que acusaram de os ter deixado à mercê de ataque de grupos pró-China e tríades.
Pelo menos nove ativistas pró-democracia de Hong Kong foram detidos cerca das 08:00 (01:00 em Lisboa) após confrontos com manifestantes pró-China, no centro da cidade, onde decorrem as cerimónias do 20.º aniversário da transferência de soberania, tendo saído em liberdade ainda durante a manhã.
Joshua Wong, que já tinha sido detido na quarta-feira, juntamente com 25 ativistas, durante uma concentração realizada na praça Bauhinia, no centro da cidade, e libertado, foi um dos detidos de hoje.
De novo em liberdade, o líder dos protestos pró-democracia de 2014 disse em conferência de imprensa, que apesar de o protesto ter sido autorizado pelas autoridades, os manifestantes foram alvo de "ataques violentos" por grupos pró-China durante a manifestação em Wan Chai.
Os ativistas seguiam em direção ao centro de convenções, onde decorria a cerimónia de tomada de posse da nova chefe do Executivo, Carrie Lam.
"O que nós encontrámos foi gangues pró-China e tríades (...) que nos cercaram e bloquearam a nossa manifestação a pedir a democracia e a libertação [do ativista chinês] Liu Xiaobo", disse Joshua Wong, num dos vídeos de uma conferência de imprensa divulgada através da rede de mensagens instantâneas Twitter.
"Durante os ataques violentos constatámos que a polícia não fez nada e permitiu que aqueles gangues empunhassem a bandeira nacional e nos perturbassem até às 08:00 [01:00 em Lisboa, quando começaram as cerimónias oficiais]", acrescentou.
Joshua Wong classificou a situação de "absolutamente inaceitável" e "sem base legal", descrevendo que ele próprio foi algemado e que outros ativistas foram alvo de agressões de agentes no carro da polícia a caminho da esquadra.
"Condenamos veementemente a atuação da polícia por não proteger os manifestantes pacíficos e por permitir -- se não arranjou, pelo menos deixou -- estes 'gangues' atacar-nos", afirmou.
O também secretário-geral do partido Demosisto disse ainda que espera que "na manifestação de 01 de julho, na tarde de hoje, em vez de permitirem que os grupos leais pró-China continuem a perturbar o nosso protesto".
Na conferência de imprensa, Avery Ng, da Liga dos Sociais Democratas, descreveu aos jornalistas que os ativistas receberam informações contraditórias de diferentes agentes sobre se estavam ou não detidos.
"Assim que o veículo entrou em andamento, eu perguntei repetidamente aos agentes se estavámos detidos. Inicialmente, responderam que não sabiam, mas alguns minutos depois disseram que sim", contou Avery Ng. "Perguntei sob que acusações mas não responderam", afirmou.
"Assim que o veículo chegou à esquadra da polícia, outro grupo de polícias disse-nos: 'Vocês não estão presos, vocês estão livres, podem ir embora'. Este é o facto", acrescentou.
O ativista sublinhou que "a polícia está claramente a abusar do seu poder".
"Esta manhã, o objetivo era muito simples. Na verdade os objetivos tanto da polícia como das tríades são muito parecidos. O seu dever era impedir-nos de ir à cerimónia da manhã para protestar contra [o presidente da China] Xi Jinping", sublinhou.
Avery Ng acrescentou que "nas passadas 72 horas, a Liga dos Sociais Democratas foi alvo de detenções múltiplas e ataques violentos por elementos das tríades".
"O número supera a centena. Ao mesmo tempo, mais de 100 polícias foram destacados para seguir alguns dos nossos principais membros nos últimos três dias. Isto é o tipo de recursos que eles usam para reprimir um só partido político", adiantou.
Na conferência de imprensa, Joshua Wong e Avery Ng surgiram acompanhados por outros ativistas que também tinham sido levados pela polícia, como o deputado Leung Kwok-hung (conhecido por "Long hair" ou "Cabelo comprido") e pelo deputado Eddie Chu, entre outros.
O Presidente chinês chegou na quinta-feira a Hong Kong para as cerimónias do 20.º aniversário da transferência de soberania do Reino Unido para a China - 01 de julho de 1997 - e para investir a nova chefe do Executivo da Região Administrativa especial chinesa.
FV (EJ) // EJ
"Fazer barulho" nas ruas é a opção para quem não tem direito a voto
02 de Julho de 2017, 02:40
Hong Kong, China, 02 jul (Lusa) -- Aos 12 anos, Lum Lum é uma entre milhares de pessoas que, hoje, saíram à rua em Hong Kong para reclamar a eleição direta do líder da região.
Cerca de 60.000 pessoas, segundo a organização, ou 14.500, para a polícia, participaram na manifestação. Qualquer dos números está bastante aquém das manifestações realizadas há alguns anos, com muitos residentes frustrados com a falta de resultados dos protestos de rua.
Apesar de longe do 'fôlego' do "Occupy", que em 2014 paralisou durante 79 dias várias zonas da antiga colónia britânica para pedir a eleição do chefe do Executivo por sufrágio universal, os protestos continuam a fazer parte da cultura de Hong Kong, que assinalou os 20 anos da transição para a China.
Da família de Lum Lum só a irmã mais velha faltou à manifestação, "porque tinha muito para estudar", contou à agência Lusa, sob o olhar atento dos pais e de uma tia, enquanto caminhava desde o Parque Vitória em direção ao Conselho Legislativo (o parlamento da cidade).
"Estamos aqui porque queremos eleger o nosso chefe do Executivo e também porque não queremos mais corrupção no governo", disse Lum Lum à Lusa.
A pequena "ativista" começou a participar nos protestos pacíficos "desde os 3 ou 4 anos", por iniciativa do pai. Atenta ao que se passa na Região Especial Chinesa, a menina disse que a visita do Presidente chinês, Xi Jinping, não lhe despertou nenhum sentimento.
"Também não tenho qualquer mensagem para ele, porque se tivesse ele não me ia ouvir", acrescentou.
Já em relação aos ativistas que ao longo da semana foram sendo detidos e libertados, a menina mostrou determinação nas palavras. "Sinto tristeza e raiva. Eles não fizeram nada e tiveram problemas apenas porque queriam dizer ao Governo o que está mal em Hong Kong", afirmou.
Ao contrário de Lum Lum, a professora de Economia Anson Suen, de 31 anos, não é uma presença assídua nos protestos de rua. Juntou-se à grande manifestação em 2003, quando meio milhão saiu à rua, e no 20.º aniversário da região sob a soberania chinesa também achou que fazia "todo o sentido".
"Se o Governo central quer que nós amemos o país, então devia permitir mais liberdade de expressão, respeitar as nossas instituições e dar-nos a verdadeira democracia", disse.
Anson Suen seguia com um grupo de amigas, incluindo a também professora Dodo Lo, de 35 anos, que explicou o que a move nos protestos de rua.
"Talvez não faça a diferença, mas pelo menos fazemos barulho para demonstrar o nosso descontentamento. Queremos que eles saibam que não estamos felizes, mas eles ignoram-nos", disse.
Hong Kong foi integrada na República Popular da China em 1997, ao abrigo da fórmula idealizada por Deng Xiaoping para a reunificação do país, a qual permite a continuação por mais 50 anos do "modo de vida" do território, nomeadamente as liberdades de expressão, imprensa e de associação, desconhecidas no resto do continente.
Mas nos últimos anos, muitos residentes têm manifestado preocupações crescentes, denunciando interferências de Pequim nos assuntos da cidade e a erosão das liberdades.
É essa preocupação com o futuro de Hong Kong que continua a levar Choi, uma mulher de 39 anos, todos os anos à manifestação realizada a 01 de julho.
"Os padrões de vida e das liberdades têm vindo a diminuir, sobretudo nos últimos anos", afirmou, acrescentando que "a questão da democracia está pior do que há alguns anos".
Pequim prometera deixar os residentes de Hong Kong escolherem em 2017 o líder por voto direto, o que poria fim ao atual sistema de eleição através de um colégio eleitoral, mas com a condição de que os candidatos fossem aprovados por um comité de nomeação, algo que os pró-democratas contestaram, alegando que só os candidatos pró-Pequim teriam "luz verde".
Depois do "Occupy", essa reforma política foi chumbada pelo Conselho Legislativo de Hong Kong em junho de 2015, com o campo pró-democrata a votar em bloco contra a proposta.
Carrie Lam, a nova líder de Hong Kong eleita em março passado, foi escolhida por um colégio eleitoral composto por 1.200 membros. Primeira mulher a exercer o cargo, Lam obteve 777 votos.
Quando foi eleita, Carrie Lam prometeu "unir a sociedade", mas sem se comprometer com um calendário para iniciar um eventual novo processo de reforma política.
No sábado de manhã, Xi Jinping empossou Lam no cargo, no último dos três dias de uma visita oficial a Hong Kong, para assinalar a data.
FV (DM) // JLG
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