Miguel Guedes* – Jornal de Notícias, opinião

Bernie Sanders podia ter plagiado as palavras de Ted Cruz na Convenção Republicana: "Votem segundo a vossa consciência". Não o fez. Pelo contrário, tentou persuadir os seus apoiantes de que não há dúvida possível na escolha entre Clinton subjugada aos piores jogos de interesses e Trump que não abdica de se apresentar no papel do palhaço rico que insiste em ser dono do circo. Ainda assim, a relutância com que os congressistas receberam os pedidos de união à volta da candidatura de Clinton, entre vaias e assobios, mostra bem como estão transviadas as opções de voto nos democratas do movimento "Bernie or Bust". Como referia a humorista Sarah Silverman no palanque, "vocês estão a ser ridículos". Trump fechou a porta do Congresso Republicano a liderar as sondagens nacionais. O que antes era um alerta é agora uma certeza: não é mais possível admitir que Trump nunca poderá ganhar. Há muito que Trump não tem mas pode.
A cruzada de diabolização esteve sempre presente na campanha de Clinton em relação a Sanders. Incapaz de gerir a sua imagem do passado, a candidata democrata preferiu a cabala, dividindo o partido para depois redefinir a sua margem para o perdão. Esticou a corda, confiando que Trump seria um candidato fácil de bater caso conseguisse ganhar a nomeação no seu partido. Ganhar a Bernie, o homem que queria aumentar o ordenado mínimo para o dobro, esse perigoso demónio. Lá como cá, agitam-se as águas. António Saraiva sai da audiência de ontem em Belém atirando-se ao Bloco de Esquerda pela "leitura de diabolização" dos empresários. Temeroso do esvaziamento do poder da concertação social após ter defendido um aumento do salário mínimo abaixo dos actuais 530 euros, o presidente da CIP atira-se a esses perigosos radicais com cauda que pretenderam devolver um pouco mais às pessoas daquilo que lhes foi retirado. Há qualquer coisa que alguns patrões têm e não podem.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
*Músico e advogado
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