Afonso Camões | Jornal de Notícias | opinião
Braços abertos sobre a cidade maravilhosa e a baía da Guanabara, a estátua do Cristo Redentor, considerada uma das sete maravilhas do mundo moderno, é uma das vítimas da profunda crise que se abate sobre o Brasil, qual metáfora de um país onde a Páscoa política tarda a chegar.
A arquidiocese do Rio de Janeiro, responsável pela manutenção da estátua em forma de cruz, pede ajuda e apela à generosidade de fiéis e não fiéis para que depositem os seus donativos. Alega que não tem dinheiro suficiente para suportar os custos de manutenção do Cristo, que ascendem a cinco milhões de reais (cerca de 1,5 milhões de euros) ao ano.
No topo do morro do Corcovado, a 710 metros acima do nível do mar, sobre uma base de oito e mais 30 metros de altura, o monumento é muito exposto a ventos e intempéries, e necessita de reparações constantes.
Aquele abraço de 28 metros de largura é um poderoso íman para as descargas elétricas, em dias de tempestade, que provocam danos frequentes no sistema de pára-raios e no corpo da estátua, enquanto os mosaicos de pedra sabão que revestem as 1145 toneladas de betão armado vão caindo como caspa. Tais quais dezenas de políticos de todas as formações que sucumbiram ao pecado da corrupção.
A crise secou as fontes de financiamento. As empresas que colaboram na manutenção de uma das mais fotografadas estátuas do Mundo não querem abrir mais os cordões à bolsa, a Igreja não tem conseguido atrair novos mecenas, e os donativos batem no fundo. Tal qual a credibilidade dos governos. O monumento mais visitado do Brasil recebe mais de três milhões de pessoas por ano. Não deixa pois de causar surpresa que venha agora pedir esmola. Até porque a entrada para o Cristo Redentor não é barata: quase 20 euros na época alta e fins de semana. As receitas de bilheteira são repartidas entre o Governo Federal, gestor do Parque Nacional da Tijuca, onde se encontra o santuário, e a empresa concessionária de transportes que leva os turistas ao morro.
Já a arquidiocese carioca garante que não vê um cêntimo desse negócio milionário. Isto, para além do que cobra em comunhões, casamentos e batizados que celebra na capela consagrada a Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, aos pés da estátua. Daí para cima, sobra o preço da idolatria. Ou, em alternativa, se quisermos, lá como cá, a esperança de uma nova Páscoa, cada ano, porque todos os dias são dias de celebrarmos a vida. A de crentes e não crentes, de cada um de nós. Aleluia!
*Diretor
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