O homem condenado em 1976 pelo assassinato do cineasta italiano morreu ontem, aos 59 anos, vítima de cancro.
Pino Pelosi (casaco aos quadrados) reconstituindo o crime, com a polícia italiana |
Serviços secretos? Um grupo de extrema-direita? Um crime comum? Nico Pelosi, também conhecido por "Rana", confessou ter assassinado Pier Paolo Pasolini e foi por isso condenado a apenas cinco anos de prisão (1976 e 2001). Em 2005, já liberto, resolveu contar uma outra versão do caso. Morreu ontem e levou consigo para a sepultura os segredos do caso, recorda agora o El País.
Em 2 de novembro de 1975, Pelosi tinha 17 anos e já era conhecido da policia, por delinquência menor (assaltos a carros, etc). Naquela tarde, foi abordado, na estação de Termini, em Roma, pelo escritor, poeta e cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, de 53 anos, realizador de filmes como "120 dias de Sodoma", "O Evangelho segundo São Mateus" ou "Decameron".
Pasolini pagou-lhe vinte mil liras em troca de um encontro sexual. Propôs-lhe que comessem qualquer coisa e depois fossem a Ostia (uma zona balnear nos arredores da capital italiana). E lá foram, no Alfa Romeo GT 2000 do cineasta. Chegados ao destino, Pasolini estacionou num descampado. Então Pelosi terá recusado ter relações sexuais. Saiu do carro mas parece que o cineasta o perseguiu e o agrediu com um pau - algo que toda a gente que conhecia bem Pasolini disse depois ser impossível.
Pelosi respondeu agredindo brutalmente o cineata, até à morte. Meteu-se no Alfa Romeo e terá mesmo atropelado o corpo estendido de Pasolini, esmagando-lhe a zona toráxica. Fugiu abandonando o cadáver e foi apanhado à noite pela polícia porque conduzia a alta velocidade e na contramão numa estrada de Ostia.
Primeiro, limitou-se a dizer que tinha roubado o carro. Depois o cadáver de Pasolini foi encontrado e Pelosi não teve outro remédio senão confessar (tinha manchas de sangue na roupa). Na altura ficou logo claro que havia pelo menos uma terceira pessoa envolvida (encontraram no carro uma camisola que não era de nenhum dos dois). Mas as averiguações não passaram de Pelosi. O regime italiano, dominado pela democracia-cristã, definiu o caso como um assunto entre homossexuais. "Estava a pedi-las", disse Giulio Andreotti, o chefe do Governo.
Em 2005, já cumprida a pena de prisão, Pelosi resolveu contar uma outra versão do caso. Ele e Pasolini tinham praticado sexo oral no Alfa Romeo GT 2000. Depois Pelosi saiu para urinar e aí apareceram três homens desconhecidos, dos seus 45/46 anos, italianos com sotaque do sul, calabreses ou sicilianos. Foi agredido por um deles, que lhe ameaçou a família se ele alguma vez contasse a história. Os outros dois agrediam brutalmente, até à morte, o cineasta, chamando-lhe "paneleiro" e "porco comunista". Desapareceram na noite e Pelosi, desesperado, meteu-se no carro e fugiu, atropelando sem querer o cadáver de Pasolini.
Porque é que Pelosi mudou a sua história? Ele argumentou que tinha medo de represálias, por isso a versão inicial. Depois, as suspeitas viraram-se para um criminoso conhecido por Johny Gitano e para os irmãos Borsellino, dois extremistas sicilianos de direita num grupo infiltrado pela polícia (morreram ambos de Sida nos anos 90 do século passado). O assassinato de Pasolini deixou de ser uma história simples de crime comum passando a poder ser um crime político.
Ontem, o advogado da família do cineasta, Nino Marazzita, lamentou: "Pino Pelosi nunca quis contribuir para que se soubesse a verdade sobre a morte de Pier Paolo Pasolini. Desgraçadamente, levou os seus segredos para a sepultura."
Fonte: DN
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