Em dia de reinício das aulas, diretores denunciam atrasos na libertação das verbas de 2017 por parte do governo
As escolas estão a cortar no aquecimento das salas para conseguir pagar as contas ao fim do mês. No dia em que os alunos começam o segundo período, e numa altura em que se prevê uma descida acentuada das temperaturas, os diretores acusam o governo de ainda não ter transferido as verbas de 2017 e admitem grandes dificuldades de funcionamento, com pesadas faturas energéticas que não deixam margem para renovar computadores e investir em materiais para as aulas.
"A nossa sala tem quatro de cada lado oito. Estavam zero graus! Não, não estavam no frio estavam desligados, não se pode ligar nem um." A descrição acompanhava a fotografia de uma sala de aulas em que se viam vários aparelhos de ar condicionado e foi publicada em dezembro num blogue de educação para denunciar a falta de aquecimento em escolas portuguesas. Manuel António Pereira, diretor do agrupamento de escolas de Cinfães e presidente da Associação Nacional de Diretores Escolares, confirma este retrato e fala de "gravíssimas limitações financeiras", admitindo que muitas escolas do interior do país passam por grandes dificuldades para combater o frio. "O dinheiro não dá para tudo e já estamos a viver em duodécimos. Os encargos básicos são muito grandes, com água, gás, eletricidade, comunicações, e o orçamento mal chega. Por exemplo, gastámos três mil euros em gás em duas semanas, e este ano o frio até começou mais tarde", exemplifica o diretor de Cinfães - concelho de um dos distritos com temperaturas mais baixas do país, Viseu -, que tem uma conta anual de cerca de 30 mil euros em gás, a que se somam 45 mil euros por ano em eletricidade.
Constrangimentos que levam Manuel António Pereira a adiantar que já há material da escola que dirige que está a deixar de funcionar, assumindo um dilema: "Tentamos que o bem-estar dos alunos seja posto em primeiro lugar, mas depois não dá para renovar material, investir em projetores, computadores ou quadros interativos. O nosso parque informático já tem dez anos e é um problema muito complicado das escolas portuguesas."
Mais no litoral, o diretor do Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos (Vila Nova de Gaia) e presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, também fala em casos de escolas que em alturas de frio não conseguem ligar o aquecimento porque a despesa energética é grande, mais acentuada em escolas renovadas pela Parque Escolar. "Se tivessem os aquecedores ligados, o dinheiro não chegaria e muitas assumem que não os podem ligar", conta Filinto Lima, que aproveita ainda para criticar os projetos orçamentais "para inglês ver" que as escolas têm de apresentar. "O nosso dinheiro vai todo para pagar água, luz, telefone. Por exemplo, eu pedi cinco computadores no orçamento e não veio nenhum. Era fundamental adquirir material informático para as escolas, os computadores estão obsoletos e a rede de internet é miserável."
"As escolas estão a viver com muitas dificuldades", concorda o diretor da secundária Eça de Queirós (Póvoa de Varzim) e ainda presidente do Conselho das Escolas, José Eduardo Lemos, que avança que "há verbas referentes ao ano que já terminou que só começaram a chegar hoje [ontem] e outras que ainda falta entregar". Em resposta a esta denúncia, o Ministério da Educação explicou ao DN que o processo de distribuição do orçamento de funcionamento às escolas é iniciado no arranque de cada ano económico, pelo que as escolas estão em processo de submissão da sua proposta de orçamento de funcionamento. "Após conhecimento do orçamento inicial, ao longo do ano e sempre que considerado necessário, desde que devidamente fundamentado, existe a possibilidade de as escolas e agrupamentos de escolas enviarem um pedido de reforço, para análise pelo serviço competente, nomeadamente no que se refere à verificação da respetiva execução orçamental em todas as fontes de financiamento. No caso de a análise ser favorável é autorizada a correspondente requisição de verbas."
A atribuição dos orçamentos aos agrupamentos de escolas tem em atenção, por exemplo, as delegações de competências e contratos existentes, a despesa realizada no ano anterior, a variação registada no número de alunos em relação ao último ano, o aumento de preços em determinados grupos de despesas e a proposta do estabelecimento de ensino. No entanto, contrapõe José Eduardo Lemos, "o que percebemos é que o Instituto de Gestão Financeira da Educação não liberta verbas nem tem atendido os pedidos de reforço feitos pelas escolas, quando os orçamentos se esgotam". Tal como os seus colegas, o diretor da Eça de Queirós garante que as verbas libertadas dão apenas para o funcionamento básico, e que tudo o resto - materiais, computadores, equipamentos pedagógicos - está a ser afetado por limitações de financiamento. "Dá ideia que o IGEFE se sentou em cima do cofre do Ministério da Educação e não liberta o dinheiro. Não há calendários nem regras para libertação das verbas, nem sequer conhecemos os orçamentos de outras escolas."
Pedro Vilela Marques / DN
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