quarta-feira, 4 de julho de 2018

Perícias recusam estatuto de ferido grave a 52 vítimas dos fogos

Exames periciais são passo essencial para as vítimas terem acesso às indemnizações do Estado pagas pela Provedoria de Justiça. Sem serem feridos graves, terão de recorrer a outra entidade pública.
O Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) já concluiu a avaliação médica a 96 vítimas dos incêndios do ano passado que queriam ser consideradas "ferido grave", tendo recusado atribuir esse estatuto a 52.
Sem este estatuto as vítimas terão de ir para os tribunais ou recorrer a uma outra comissão criada pelo Parlamento para garantirem uma indemnização pública.
Para ser considerada "ferido grave" a vítima teria de comprovar pelo menos um dos seguintes danos: internamento hospitalar com dano permanente de relevância funcional ou estética; internamento por um período não inferior a 30 dias ou com verificação de perigo de vida; internamento com lesão que, de acordo com os critérios médico-legais, provoque dor em grau considerável; danos psiquiátricos permanentes com repercussão considerável na autonomia pessoal, social ou profissional da vítima; ou perda ou diminuição permanentes da utilização de qualquer dos sentidos ou funções com interferência significativa na perceção da realidade envolvente.
O INMLCF adianta à TSF que até agora recebeu cerca de 150 requerimentos remetidos pela Provedoria de Justiça , tendo já concluído 96 processos, sendo que em 52 casos "concluiu-se pela não-integração no conceito de ferido grave".
Na prática, para serem indemnizadas pelo Estado essas vítimas terão agora de recorrer a uma outra comissão criada pelo Parlamento, a "Comissão para Avaliação dos Pedidos de Indemnização" , que funciona junto da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça e avaliará todos os casos que não sejam de morte ou de feridos graves.
Fonte da Provedoria de Justiça também confirma à TSF que já começaram a receber avaliações do instituto de medicina legal e que vão começar a informar as vítimas dos direitos que têm e do acompanhamento que terão, bem como que o seu processo será encaminhado para a referida comissão e que mesmo as que não foram consideradas graves podem recorrer àquela comissão ou mesmo aos tribunais.

"Processos difíceis e complexos"

O presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses adianta à TSF que deram "caráter prioritário" a estes processos, numa avaliação "concluída em poucos dias após a receção das informações clínicas necessárias", com os exames a serem marcados rapidamente.
Depois dos 31 milhões de euros já transferidos pelo Estado através da Provedoria de Justiça para as famílias das 114 vítimas mortais dos fogos, o processo dos feridos é mais "difícil e complexo".
Francisco Corte-Real destaca que o instituto dedicou uma equipa específica de 8 médicos a estas perícias e "os relatos de sofrimentos são muito fortes, mesmo para médicos que estão habituados a avaliar vítimas de acidentes, havendo ainda muitas pessoas em tratamentos, cuja situação clínica não está ainda estabilizada e necessitam de intervenções".
"Vítimas não graves também terão direitos garantidos"
O presidente do INMLCF garante, contudo, que as vítimas que não foram consideradas graves terão os seus direitos garantidos ao recorrerem para a Comissão de Avaliação dos Pedidos de Indemnização.
Francisco Corte-Real desdramatiza o facto de 52 vítimas terem visto recusado esse estatuto e sublinha que apenas aplicaram os critérios definidos pelo conselho para a fixação de critérios de indemnização das vítimas de incêndios.
O representante do instituto adianta que em alguns casos, mesmo dificilmente sendo consideradas feridos graves, as vítimas até poderão ter direito a uma indemnização superior. "Cada caso é um caso", sublinha.
Recorde-se que em outubro o governo assumiu, em nome do Estado, a responsabilidade pelo pagamento das indemnizações às vítimas (e familiares dos mortos) dos incêndios dos dias 17 a 24 de Junho e 15 a 16 de outubro de 2017, aprovando um mecanismo extrajudicial, fora dos tribunais, de adesão voluntária, destinado à determinação e ao pagamento, de forma ágil e simples, de indemnizações.
Nuno Domingues / TSF


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