Este ano, a ASAE “continuará atenta a eventuais ilícitos em matéria de práticas comerciais com redução de preços dirigidas aos consumidores que ocorram durante o evento da Black Friday, desenvolvendo acções de fiscalização e assegurando o integral cumprimento da legislação em vigor”, revela.
Dar armas ao consumidor
As queixas de preços inflacionados na véspera das promoções levaram a Deco a analisar 1862 produtos no ano passado. A conclusão não foi abonatória para o comércio: antes da Black Friday foram muitas as lojas que aumentaram os preços. Por exemplo, um televisor que custava 1099 euros subiu para 1744 euros dias antes da promoção, para depois ser vendido por 1439,20 euros.
“Esta manipulação não foi generalizada, mas 5% dos produtos com descontos anunciados nessa altura violavam a Lei das Práticas Comerciais Desleais e a Lei dos Saldos e das Promoções”, refere a Deco Proteste, que este ano tem uma ferramenta online que permite confirmar se a loja está “mesmo a propor um bom negócio”. O siteanalisa a variação do preço online nos últimos 30 dias para que o consumidor saiba se o desconto proposto é ou não vantajoso, mas inclui apenas electrodomésticos e tecnologia. Tito Rodrigues, jurista da Deco, explica que estas são as áreas onde se têm “sentido mais variações de preços”.
“Estamos numa fase de prevenção e de dar armas ao consumidor para que possa fazer uma escolha informada. A maior parte faz fé nas campanhas com descontos que nem sempre são tão reais ou apelativos como as cadeias de retalho fazem crer”, diz ao PÚBLICO.
A Deco cita dados da SIBS, que contabilizou transacções de 700 milhões de euros neste dia em 2015. Tito Rodrigues acredita que o montante será novamente atingido e até “poderá ser superior”, tendo em conta a maior disponibilidade económica.
Ana Isabel Trigo de Morais, directora-geral da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED) — que representa cadeias como a Fnac, C&A, Continente ou Pingo Doce —, garante que o montante das promoções se traduz no que “os retalhistas podem, em conjunto com os seus fornecedores, oferecer aos consumidores”. O que preocupa os associados é o cumprimento escrupuloso “do enquadramento da actividade”, afirma.
Já João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), sustenta que há “subidas artificiais de preço”, mas o que realmente se passa no mercado é um aumento geral dos preços de tabela dos fornecedores. Com as promoções constantes, sobem os valores dos produtos “para poderem absorver” margens mais baixas.
Em aquecimento para o Natal
Para os maiores grupos de retalho, a Black Friday tem grande impacto na afluência às lojas, mas enquadra-se num contexto de quase normalidade. As promoções são constantes e este é só mais um pretexto para cativar clientes. “O comportamento do consumidor é muito focado no preço e nas propostas de oportunidade que são conferidas através da realização de actos promocionais. E, nessa matéria, os retalhistas têm respondido a esse comportamento”, diz Ana Trigo de Morais, sublinhando que “todos querem conquistar o coração dos consumidores”.
Os portugueses estão viciados em promoções: sete em cada dez compras nos supermercados incluem produtos com desconto e, este ano, 48% dos inquiridos pela Deloitte apontaram as promoções como um dos motivos que os levam a decidir gastar mais no Natal. A um mês da época festiva, esta é também uma forma de o comércio conseguir antecipar vendas, na altura mais importante do ano para o negócio.
A Fnac foi uma das primeiras cadeias de retalho em Portugal a fazer promoções neste dia e garante que os descontos que oferece “são oportunidades que não se repetem”. Os produtos tecnológicos são o grande foco da campanha, que abrange as lojas físicas e o canal online, onde a empresa tem “expectativa de bater recordes de vendas nesta Black Friday”, diz fonte oficial. “Há um conjunto de clientes que preferem fazer comodamente as suas compras, longe das confusões, onde quer que estejam, e o online oferece essa possibilidade”, acrescenta.
Apesar de a campanha acontecer a um mês do Natal, a maior parte dos clientes “ainda faz as suas compras em Dezembro”, afirma a empresa, que ontem enviou um SMS aos clientes a dar conta da campanha com um link que, por lapso, direccionava para um site concorrente (Worten).
Para a Lanidor, não há como escapar da Black Friday. A marca portuguesa de vestuário começou por fazer descontos neste dia em 2014, mas restritos aos clientes com cartão de fidelização. No ano passado decidiu alargar as promoções a todos os consumidores e teve uma “adesão e resultados muito significativos”.
“É, de facto, um movimento global, importado dos EUA e tem conseguido mobilizar os clientes para as compras nesse dia. Em 2014 demos conta de que estava a ter sucesso, em 2015 aderimos inteiramente”, diz a empresa, que vai oferecer reduções de 25%. Contudo, ao contrário do que se passa nos Estados Unidos, os portugueses fazem as compras de Natal mais em cima da data. Por isso, a Lanidor sustenta que, por cá, esta campanha pode ser vista mais “como um regresso em força ao consumo, reinaugurando uma época forte em termos de vendas”.
Esta sexta-feira não é nenhuma excepção à regra para a cadeia americana de brinquedos Toys ‘R’ Us. Desde 2011 que promove a campanha e, este ano, promete descontos directos de 50%, que já arrancaram na passada segunda-feira e se prolongam até dia 27. Com esta iniciativa, a Toys ‘R’ Us espera “repetir o sucesso das edições anteriores, onde se registou grande afluência de clientes”, diz fonte oficial.
Apesar da “grande receptividade”, os descontos são uma realidade ao longo de todo o ano, fenómeno “muito importante para impulsionar as visitas às lojas”, diz a empresa. “Cada vez mais o consumidor procura promoções para comprar os seus produtos mais desejados”, refere.
Por estes dias, não há quem não tenho sido bombardeado com emails, SMS, folhetos e anúncios na televisão com promessas de descontos elevados. Fala-se na “febre dos descontos”, na “Black Friday anxiety” (a ansiedade da Black Friday), transmite-se uma “urgência” de compra e a ideia de que só nesta sexta-feira vai ser possível ter o produto por um preço mais acessível. Ainda que longe das imagens que chegam dos Estados Unidos, onde pessoas se degladiam por uma camisola, a tradição também contaminou o comércio nacional, ainda a recuperar da crise de consumo.
Público
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