sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Macroscópio – Ainda há alguma coisa a discutir no PSD? Talvez pareça que não, mas há.

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
 
Três debates, uma enxurrada de entrevistas, muitos comentários sobre quem ganhou e quem perdeu, numerosas tomadas de posição públicas de apoio a um dos dois candidatos à liderança do PSD, Santana Lopes e Rui Rio. Este Macroscópio vai, deliberadamente, passar ao lado de toda esta imensa quantidade de informação, com as suas voltas e reviravoltas, para se centrar num conjunto de texto que, de alguma forma, procuram reflectir ou analisar a situação do PSD sem se prenderem à defesa deste ou daquele candidato. Textos escritos nos últimos dias e que procuram, na sua maioria, tratar o tema do futuro do PSD enquanto partido, assim como o futuro do espaço não-socialista em Portugal.
 
Começo por um texto de uma figura destacada do PSD, Miguel Poiares Maduro: trata-se de Chamem-me o que quiserem e nele abordam-se as dificuldades que o actual momento político coloca aos partidos, em Portugal e não só, sublinhando o que considera ser “um paradoxo”: “Por um lado, a retórica dos programas políticos é consensual. Todos têm como prioridades a justiça social, a competitividade, a inovação, a reforma do Estado... Por outro lado, o nosso debate político nunca foi tão violento. Para os cidadãos, os partidos tradicionais nunca foram, ao mesmo tempo, tão iguais e tão inimigos entre si. Slogans comuns escondem as verdadeiras divergências. É por isso que os consensos úteis, e que exigem passar dos slogans vazios às medidas concretas, são cada vez mais difíceis. Os consensos são pretendidos com base em oportunismo e não em princípios.”
 
Antes da publicação deste texto Nuno Garoupa, que não está ligado ao PSD, tinha publicado durante o mês de Dezembro um conjunto de três textos no Diário de Notícias – A crise do PSD (I): o sorpasso, A crise do PSD (II): a implosão A crise do PSD (III): a sociologia eleitoral do "passismo"  – onde traçava diferentes cenários, todos pessimistas, relativamente ao futuro do partido fundado por Sá Carneiro. Conclusão? Em síntese esta: “Chegados aqui, penso que se perspetivam três cenários para o futuro do PSD: "spdização", "sorpasso" ou implosão. Continuo a pensar que o cenário mais provável é a "spdização"”. 
 
Vários textos procuraram responder aos dilemas colocados pelo que muitos visualizam como “uma crise”, sendo que as análises variaram entre as que puseram mais o acento tónico na necessidade de um reposionamento político e ideológico, enquanto outras olharam mais para o tema das lideranças. Vejamos alguns deles:
  • O PSD, de Maria João Avillez no Observador, é uma crónica onde se recorda o que já foi o PSD e se elabora sobre o facto de, nesta corrida à liderança, não terem surgido figuras mais novas com outro tipo de mensagem: “Nunca há ninguém até haver alguém, mas a permanente reedição desta (desculpabilizante) dúvida atirada como uma certeza tolhe escolhas, inquina a política, atrapalha o futuro. De facto nenhum quarentão recomendável — e há uma boa meia dúzia deles — se chegou à frente. Estão a espera? Se estão, ao menos que saibam que se cada um não cria as suas próprias circunstâncias e se bate por elas, não há política para ninguém e, no caso, olhem para Santana ou Rio que em tempo as criaram.”
  • Fernando Sobral, no Jornal de Negócios, recorda os ensinamentos de um filme que estreou esta semana sobre a II Guerra Mundial para, em Churchill e o PSD, também considerar que há aqui sobretudo um problema de lideranças: “O PSD precisa de um líder que, como Churchill, prometa a vitória. Que não diga aos portugueses aquilo que querem ouvir. Que traga inspiração e criatividade para o debate público. Que não siga a opinião pública e os "focus groups". Mas que, antes, lidere o debate sobre os desafios que interessam ao futuro de Portugal.” 
  • Em O PSD e a ideologia, João Marques de Almeida, colunista do Observador que colaborou com a candidatura de Santana Lopes, defende que, na área do PSD e do CDS há hoje um vazio por esses partidos não responderem, com as suas propostas e ideologia, àquilo a que aspira uma parte importante da população e do eleitorado: “O eleitorado de direita em Portugal, as populações rurais, as profissões liberais, os pequenos e médios empresários, os comerciantes, sentem-se órfãos. Ninguém os quer representar. Mas mesmo assim eles são de uma admirável lealdade, e ano após ano, nas legislativas, nas presidenciais, nas europeias, nas regionais, nas autárquicas, eles votam mesmo naqueles que recusam ser de direita. Não deverá haver na Europa um caso de fidelidade tão mal respeitada e tão mal tratada como a do eleitorado de direita em Portugal.” Por isso, defende, quase a concluir, que “Mais de de 40 anos depois do 25 de Abril, não estará na altura do PSD e do CDS de cuidarem dos seus? Se continuarem a não fazê-lo, outros o farão.
  • Porventura ainda mais directo, Ricardo Arroja defendeu no jornal online Eco que A alternativa é o liberalismo. Na sua perspectiva, “mais do que esquerda ou direita, o verdadeiro debate a fazer em Portugal consiste em opor à burocratização da sociedade a ideia da liberdade de escolha”. Ora, defende mais adiante, “nunca como hoje foi tão necessária a alternativa ao rumo de burocratização da economia e da sociedade que temos seguido. Nunca como hoje foi tão necessária uma alternativa liberal, que valoriza em primeiro lugar o indivíduo e que descentraliza a intervenção estatal. Uma alternativa que não rejeita o Estado por completo; apenas o rejeita enquanto pivô do desenvolvimento económico. Uma alternativa que rejeita o Estado como um fim em si mesmo, mas que o aceita enquanto instrumento de agregação de fins individuais.”
  • Na mesma linha está um artigo que eu mesmo escrevi no Observador, Ter medo de ser o que se é, onde peço mais frontalidade na defesa de um programa não socialista: “o que se esperaria de líderes de um partido como o PSD, assim como de todos quantos no parlamento e nos órgãos de informação se colocam do lado dos que acreditam mais na sociedade civil do que no poder redentor do Estado, é que dissessem abertamente algumas coisas. Que dissessem, por exemplo, que o milagre do crescimento dos últimos anos se deve muito a leis e reformas que ninguém parece ter hoje coragem para defender.
  • Esta ideia de que há como que um indefinível medo no espaço político ocupado pelo PSD também foi glosada por Manuel Carvalho no Público, em Um partido com medo de existir. É uma análise onde não só se refere que “O PSD está de tal forma deprimido e inseguro sobre o que foi e o que pode ser que desistiu de ousar”, como se refere a necessidade de o PSD conseguir distinguir-se mais do PS: “Com esta caminhada no sentido de se transformar num perfeito “catch-all party”, o PS ocupou um amplo espectro político e ideológico que tanto ameaça sequestrar a esquerda extrema como encurralar a direita e o centro direita. Neste albergue, cabe tudo. (...) O PSD tinha uma forma coerente de se assumir neste cerco: era recuperar os seus pergaminhos anti-estatizantes, mais liberais na economia, mais próximos da iniciativa privada e mais desligados dos poderes dos sindicatos e da função pública. Mas, para o fazer, tinha de regressar ao programa de Passos Coelho – ou, numa visão mais distante, ao PSD liberal de Sá Carneiro.”
 

Nas análises mais próximas do que foi sendo esta campanha para a liderança social democrata nota-se bastante desencanto com as alternativas disponíveis. Nenhum me convém, assume aclaramente Maria de Fátima Bonifácio num texto no Público onde analisa o primeiro debate para confessar que não ficou convencida se Rio ou Santana são confiáveis. No mesmo Público, João Miguel Tavares reflecte sobre O mistério Rui Rio com alguma amargura: “Rio é com certeza mais competente do que Santana. Não estou ainda certo que seja menos perigoso.” Na sua opinião, “se já todos os portugueses conhecem de ginjeira o perfil de Santana Lopes, o verdadeiro Rui Rio continua a ser um mistério. O meu argumento favorito para Rio vir a ser o próximo líder do PSD (não ser Santana Lopes) não é mérito dele, e aquilo que efectivamente é mérito dele – o rigor nas contas, a reputação de político íntegro, a capacidade para resistir a lóbis poderosos (como foi o caso do futebol, quando dirigia a câmara do Porto) – vem sempre acompanhado de uma sombra inquietante de autocrata. Rio, já se sabe, não gosta de jornalistas e é muito crítico do sistema de justiça português, e eu tenho um problema com políticos que gostam bastante do primeiro e do segundo poderes, mas apreciam menos o terceiro e o quarto. Encontro nessa postura um travozinho a anos 30 que me desagrada profundamente.”  
 
Regressando ao Observador, destaque para a crónica de hoje de Rui Ramos, O PSD entre os erros de ontem e os erros de amanhã. Depois de discutir o que considera serem os erros cometidos em 2004 por Santana Lopes, e aqueles que podem agora vir a ser cometidos, conclui: “O PSD tem de decidir qual é mais arriscado: se apostar nos que cometeram erros em 2004, ou se confiar nos que parecem preparar-se para cometer erros do mesmo tipo em 2019. Mais fundamentalmente, o PSD terá de escolher entre ser uma alternativa de governo ao PS, ou um mero apêndice da governação socialista. Talvez que essa ainda não seja a escolha de sábado, mas a escolha de sábado pode impedir essa outra escolha mais fundamental no futuro.”
 
Fecho este apanhado com uma longa e detalhada análise de Bernardo Ferrão no Expresso Diário, “Rio ou Santana? Quem preferem eles para a oposição?”, um texto reservado a assinantes onde se discutem vários cenários procurando perceber que candidato poderão preferir António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa e Assunção Cristas. Defende-se que quer um, quer outro, podem agradar mais ou menos, assim como encaixar-se melhor ou pior nas estratégias desses três líderes, mas que ambos podem dar-lhes vantagens e colocar-lhes desafios. Já sobre o que se pode passar no PSD, o jornalista lembra como pode ser complexo o “dia seguinte” dentro de um partido dividido e ansioso: “Como a candidatura [de Santana] é apoiada e alimentada pela máquina de Passos – a máquina que quer acabar de vez com Rio e o seu “grupo maravilha” –, o PSD ficaria mais pacificado. Numa lógica unicamente institucional, o PSD de Santana garantiria uma oposição mais enquadrada. Já o de Rio uma guerrilha interna. Não tenho certezas absolutas sobre esta tese, porque a política, como todos sabemos, é suficientemente cínica para que no day after, os que antes criticavam Rio apareçam em declarações laudatórias ao novo líder. Na hora de decidir, a manutenção dos lugares conta muito. Seja como for, há um cenário a ter em conta: o PSD olha para estes dois homens como líderes a prazo. Ninguém esconde que será muito difícil ganhar as próximas legislativas e, assim sendo, o partido daqui a dois anos estará a escolher um novo rosto.
 
Agora apetece dizer que é com os militantes do PSD, e muitos acreditam que aqueles que correram a pagar quotas já teriam a sua opção pré-definido. Ao fim do dia de sábado saberemos quem levou a melhor. Até lá, e também durante o resto do fim-de-semana, tenham bom descanso e boas leituras. 

 
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