O contrato celebrado entre o Banco de Portugal e o ex-governante campeão das privatizações termina a 1 de novembro de 2016. A proteção dos contribuintes só estará garantida com o afastamento de Sérgio Monteiro do Novo Banco.
Adriano Campos, opinião*
Em setembro de 2015, o Banco de Portugal justificava o novo adiamento na venda do Novo Banco pela falta de "condições adequadas em matérias de preço e de risco para o fundo de resolução" (recordemos que a falência do BES resultou na injeção de 3900 milhões de euros no Fundo de Resolução bancário por parte do Estado). Mais de um ano depois, o Banco de Portugal veio anunciar uma nova fase final de propostas de compra, enquanto a administração do Novo Banco avança com um agressivo plano de despedimentos.
Se há um ano tínhamos razões para temer uma enorme perda para os contribuintes com a venda precipitada, hoje sabemos o que aconteceu, desde então, no sistema financeiro português: a falência do Banif, o abalo na Caixa Geral de Depósitos, a enorme desvalorização do BCP (que ainda não pagou a totalidade dos empréstimos ao Estado), o impasse no BPI e os resultados conhecidos do próprio Novo Banco - 363 milhões em prejuízo só no primeiro semestre de 2016. O que era mau está ainda pior e ninguém acredita que a venda do Novo Banco se aproxime sequer dos valores gastos pelo Estado.
No verão, António Costa garantiu(link is external) à Comissão Europeia que, se necessário, escolheria a liquidação do banco a qualquer solução que implicasse mais perda de dinheiros públicos, enquanto Maria Luís Albuquerque, solidária, atira publicamente(link is external) as culpas para Passos Coelho pela gestão do caso. Mas nesta longa e agoniante história, uma figura não pode ser esquecida: Sérgio Monteiro, o responsável direto pela venda do Novo Banco.
Tal como denunciado(link is external) pela Mariana Mortágua, o polémico contrato de 304,8 mil euros que o ex-secretário de Estado dos Transportes assinou com o Banco de Portugal apenas foi oficializado um mês e meio após iniciar funções, em novembro de 2015, constituindo um claro conflito de interesses pelo facto de Sérgio Monteiro continuar a ser administrador da CGD (uma das entidades que constituem o Fundo de Resolução).
Desde então, multiplicaram-se os escândalos públicos envolvendo o ex-governante. Em meados deste mês, o Ministério das Finanças seguiu a recomendação da Inspeção - Geral das Finanças, pedindo a revogação(link is external) do "perdão" de 19 milhões de euros concedido ao grupo Barraqueiro e à Transportes Sul do Tejo. Em causa está um despacho assinado por Sérgio Monteiro, em agosto de 2015, que anulou a revisão das compensações relativas ao passe social devidas a estas empresas, saldando-se numa borla de 9,9 milhões de euros dada à Barraqueiro de Humberto Pedrosa. O mesmo Humberto Pedrosa que negociava, nessa altura, com Sérgio Monteiro, Secretário de Estado, a privatização da TAP.
Já em março deste ano, a CRESAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública) criticou a falta de transparência(link is external) na nomeação de Lígia Fonseca, ex-integrante do gabinete de Sérgio Monteiro no anterior governo, para a Autoridade Nacional Nacional de Aviação Civil (ANAC). A nomeação realizada por Sérgio Monteiro foi feita, segundo a CRESAP, em regime de substituição, um estatuto "que não está previsto nas entidades reguladoras", tornando o caso de Lígia Fonseca (que recebe um salário mensal de 12806 euros) em mais uma mancha na carreira do Senhor Privatizações.
Poderíamos ainda lembrar a contratação de Teresa Empis Falcão, assessora de Sérgio Monteiro responsável pelo parecer que resultou no duplo pagamento à Lusoponte: até 2011, o Estado pagava à entidade liderada por Joaquim Ferreira do Amaral (ex-Ministro pelo PSD) uma indemnização compensatória por não haver cobrança de portagem na ponte 25 de Abril durante o mês de agosto. Quando, em 2011, as portagens foram cobradas, nem por isso o governo deixou de pagar 4,4 milhões de euros à Lusoponte, através da Estradas de Portugal, resultando num duplo pagamento. E são muitos os que se recordarão ainda do caso das PPP rodoviárias, onde o ex-secretário de Estado, na altura ao serviço do banco de investimento Caixa BI, assumiu um encargo financeiro de 473 milhões com a capitalização da AELO (Auto-Estradas do Litoral Oeste), num negócio que mereceu duras críticas do Tribunal de Contas por prejudicar o Estado.
No tempo de todas as ameaças sobre o sistema financeiro, exigem-se respostas concretas para o buraco criado pelo BES. O primeiro passo será, sem dúvida, dizer claramente que este não é o homem que queremos ter à frente das negociações onde se joga o esforço dos contribuintes.
*Esquerda.net - Adriano Campos - Sociólogo, activista precário
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