sábado, 6 de maio de 2017

João Paulo Almeida: "Vamos prolongar as unidades móveis no Algarve"

João Paulo Almeida, presidente do Instituto Português do Sangue e Transplantação

Presidente do Instituto Português do Sangue e Transplantação diz que não há alarme na ligeira quebra de transplantes registada em comparação com período homólogo. Quanto ao sangue, as colheitas estão estáveis

É presidente do Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST) desde dezembro. Faz um balanço dos primeiros resultados deste ano e diz que não há razão para alarme para a ligeira quebra registada em comparação com período homólogo. Estão a ser discutidas normas para melhorar a identificação de possíveis dadores. Quanto ao sangue, as colheitas estão estáveis, mas o plano para o verão prevê prolongar a permanência das unidades móveis de colheita no Algarve

No 1.º trimestre diminuíram os dadores e os transplantes em relação ao período homólogo. Como vê a flutuação?
Nos indicadores de abril já temos recuperação. Não há motivo para alarme, mas estamos a monitorizar e não há nada que explique esta quebra. A doação é uma atividade completamente imprevisível. Houve um hospital, com atividade de doação relevante, que em março não teve dadores porque não existiram. Temos de pensar que vai acontecer mais vezes. Tem a ver com as características e o tipo de dador que temos. Mais de 80% dos dadores morrem por causa médica, o que implica que sejam mais velhos e com mais doenças.

A formação nos hospitais mantém-se.
O coordenador de doação é preponderante em relação à identificação de possíveis ou potenciais dadores. A questão de doação em morte cerebral prende-se com a identificação dos potenciais dadores no circuito. Para manter níveis elevados é preciso monitorizar o circuito desde a urgência às unidades de internamento. Com o tempo que vivemos de penúria de órgãos, e o problema é global, não podemos perder nenhuma oportunidade de doação. Para acautelar o futuro iremos propor que passem a ser obrigatórias normas de doação em todos os hospitais.

Quando poderão estar em vigor?
Com essas normas pretendemos estabelecer regras dentro do circuito para que não haja nenhuma omissão na identificação ou falha na manutenção. Serão alvo de um despacho com uma matriz que cada hospital adaptará à sua realidade. Esperamos que entrem em vigor no 2.º semestre.

Outra aposta são os dadores em paragem cardiocirculatória.
Está previsto avançarmos até ao final do ano em Lisboa. Começámos com o S. João, onde temos bons resultados: em 2016 tivemos 10 dadores e este trimestre são cinco, com uma taxa de utilização de órgãos igual aos padrões internacionais. Acredito que é um caminho, mas ainda não está esgotado o potencial de doação na morte cerebral. Por isso a nossa preocupação é continuar a investir na identificação de dadores.

Os incentivos atuais são suficientes para manter os bons resultados?
Na paragem cardiocirculatória é cedo para avaliar. São valores que terão de ser revistos. Todo o processo de manutenção de um dador implica custos elevados. Será uma forma também de incentivar as instituições a terem este esforço que deve ser nacional.

Este trimestre o transplante renal com dador vivo teve o valor mais alto dos últimos seis anos. O que mudou?
Este trimestre tivemos 26 dadores de rim vivos, o ano passado foram 19. As equipas estão mais sensibilizadas e temos de ter alternativas aos dadores falecidos. Existem muitas pessoas à espera de um rim. A 31 de dezembro de 2016 tínhamos em espera 2011 pessoas. Em 2015 eram mais. Há outro aspeto importante que são as doações renais cruzadas. Este trimestre já tivemos três transplantes renais cruzados. Desde 2013, quando começou o programa, até hoje tivemos 12. Neste momento temos ativos 22 pares. A hipótese de uma colaboração com Espanha está a ser estudada.

Estamos a trabalhar com as autoridades internacionais por causa do tráfico de órgãos numa altura em que se vive grandes fluxos de migrantes?
Temos uma jurista nos comités do tráfico e venda de órgãos. Temos uma participação muito ativa nos trabalhos da Comissão Europeia. Penso que no nosso país o problema ainda não se põe, mas não podemos deixar de estar atentos.

Mas temos situações de tráfico?
Não temos conhecimento disso.

Como está a colheita de sangue?
Estão numa situação perfeitamente estável, com mais de 10 dias de reserva para todos os tipos sanguíneos. O verão, como o inverno, são sempre desafios. Além da deslocação, as empresas e as instituições fecham no verão e é mais difícil termos as pessoas concentradas nos seus locais de dádiva. Este ano temos previsto, para precaver alguma eventual quebra, prolongar as unidades móveis no Algarve. E vamos fazer colheita no acampamento nacional escuteiros. A nossa participação é histórica, mas é sobretudo um evento promocional muito importante para o efeito de sensibilização. Tem havido boa resposta dos jovens. Estamos a cumprir as metas de 10% abaixo dos 25 anos e 20% entre os 25 e os 34 anos.

Como está o processo do plasma e o protocolo com o laboratório militar?
Não sei resultados do grupo de trabalho, mas até junho teremos novidades.

Há estimativas de poupança?
Seria relevante. O país é autossuficiente em plasma para transfusão, mas com toda a probabilidade não temos volume cujo fracionamento permita retirar todos os medicamentos que o país precisa. Mas haverá muitos que se irão conseguir. Esperamos em maio ter o caderno de encargos para lançar o primeiro concurso para o fracionamento de 30 mil litros. Esperamos que esteja tudo concluído até ao final do ano porque o IPST está a convidar todos os hospitais com colheita para juntarem o seu plasma ao do IPST e avançar com um segundo concurso em 2018. Queremos aproveitar todo o excedente do plasma de transfusão para evitar desperdício.

Perfil
Nasceu em Coimbra, cidade onde se licenciou em medicina
É especialista em medicina intensiva
Está há muito ligado à transplantação no Centro Hospitalar e universitário de Coimbra, a que pertence. Foi membro da comissão técnica de operacionalização da colheita de órgãos em dador em paragem cardiocirculatória e em 2013 fez parte da equipa do Black Sea Project (Conselho da Europa) que visitou vários hospitais na Roménia para melhorar o nível de doação de órgãos.

Fonte: DN de 6/5/2017

Nenhum comentário:

Postar um comentário