O
tempo de que emergimos eufóricos e inconscientes, agarrando nele e esbanjando-o
como se fosse um tesouro inesgotável – a admitir que haja tesouros
inesgotáveis.
Um
dia, de repente, uma criança descobre em si a Vida. Pega nesse dom maravilhoso
que nem sequer imagina como lhe veio e desata a utilizá-lo sem a mínima ideia
de que os relógios lho gastam implacáveis, certos, ritmados. Descobre mil
encantos e mil razões de se dispersar por todos eles, entregando-se-lhes
desenfreadamente, desbaratando-se, sem poupar um único instante para se deter a
ouvir aquele tique-taque-tique monotonamente rigoroso e igual a si próprio que
devia – que por vezes até desejar! – anunciar-lhe o desgaste inevitável, o
desgaste de que ela, a criança já adolescente, o adolescente já adulto, não se
apercebe sequer.
Na
ultrapassagem incessante dos minutos, a criatura dissipa todas as possibilidades.
Dissipa-as enchendo o seu tempo com o que raramente merece sair de um nada tranquilizador.
A
criatura, ansiosa, anelante, descobre em cada novo dia novos motivos de
dispersão e arranja constantemente novos passatempos. E passa o tempo. E o
tempo passa sem ser aproveitado da forma mais coniventemente. Atrás da
criatura, passatempo depois de passatempo, não surge nada, não fica nada, não
há nada de concreto. E de repente, sem que o momento seja pressentido a tempo,
a criatura descobre em si um terrível cansaço. Terrível! Mas… cansaço de quê,
se na verdade não fez nada? Cansaço de quê, se se limitou a gastar o tempo?
Sim, a gastar o tempo de vida. Sem ter feito nada. As criaturas que desperdiçam
o seu tempo, abrem os olhos sobre a própria velhice e nesse instante acordam
para a noção de serem destroços de possibilidades atraiçoadas. E a vida não se
repete!...
Por
Odete de Saint-Maurice
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