Antigo Presidente da República regressa para repetir argumentos de sempre
Cavaco Silva regressou aos palcos do PSD para repetir a velha teoria das inevitabilidades. A «aula» desta quarta-feira devia ter sido dedicada aos «jovens e a política», mas o antigo primeiro-ministro e Presidente não se desviou da sua mais antiga tese.
homem que, entre 1985 e 2016, esteve durante 20 anos na chefia do governo (1985-1995) e na Presidência da República (2006-2016) foi o convidado desta manhã da «Universidade de Verão» do PSD, para falar sobre «os jovens e a política: quando a realidade tira o tapete à ideologia».
Cavaco Silva aproveitou o regresso ao palco de uma iniciativa do seu partido para retomar o discurso revanchista que foi repetindo, particularmente, nos últimos meses do seu mandato como Presidente da República. «A realidade acaba sempre por derrotar a ideologia», sustentou, para concluir que não há outro rumo que não seja a submissão à União Europeia e às suas imposições.
O espectro da «revolução socialista»
Referindo-se ao que caracteriza como «alguns devaneios revolucionários», o antigo presidente do PSD contrapôs o cumprimento das «regras europeias de disciplina orçamental» como caminho único perante a sua percepção da realidade.
Uma percepção que, ao longo do discurso, se revela substancialmente distorcida pela lente com que o distinto executor das «regras europeias» observa a realidade. Cavaco Silva chega a falar «dos que, no governo, querem realizar a revolução socialista», após elencar dois dos «três casos» na União Europeia: a Grécia, onde o Syriza governa, e a França, onde o PS governou até Maio deste ano – ostensivamente, não nomeou o terceiro «caso».
Se o Partido Socialista francês é insuspeito em matéria de cumprimento das «regras europeias» – tal como o PS que ocupa o Governo português –, o Syriza grego pode ter iludido sectores à esquerda, mesmo fora da Grécia, mas que rapidamente deixaram de posar ao lado de Tsipras.
As saudades do «arco da governação»
Cavaco Silva foi um dos mais ferozes opositores – e dos que mais fizeram para evitar – a actual solução política portuguesa, saída das posições conjuntas subscritas pelo PS com o BE, o PCP e PEV após as eleições de 4 de Outubro de 2015. No seu canto do cisne, empossou Passos Coelho para formar um novo governo de coligação entre o PSD e o CDS-PP, que acabou derrotado na Assembleia da República, depois da derrota nas urnas.
A mensagem que o anterior Presidente da República deixou para os jovens foi de conformismo – o cumprimento das imposições do directório que dirige a União Europeia é, para Cavaco, um dogma, doa o que doer. Regressando ao primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, usou a sua resposta, numa entrevista recente ao The Guardian, sobre uma eventual saída do euro, para a classificar como «ir para outra galáxia», ou «o delírio e a ignorância».
O poder como coutada dos fiéis ao euro
A passagem de Cavaco Silva pela iniciativa do seu partido serviu, essencialmente, para recuperar a sua comunicação ao País, após as eleições de 2015, em que argumentou contra a actual solução política. Na altura, colocou os «compromissos internacionais» no quadro da União Europeia e da NATO acima dos interesses nacionais e dos resultados eleitorais.
Quase dois anos depois, o ex-Presidente continua zangado com o travão imposto à política de cortes nos direitos e rendimentos protagonizado pelos anteriores governos, e recupera os mesmos argumentos com que, enquanto governante, animou as privatizações e colocou o País na rota da moeda única.
AbrilAbril | editorial | Foto: Nuno Veiga / Agência Lusa
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