Já hoje abordámos ao de leve o que o Jornal de Notícias trouxe a público. É fraude. É público. E a justiça faz o quê? E o governo faz o quê? Assobiam para o lado, cúmplices dos modernos esclavagistas que exploram ao arrepio das normas estabelecidas e da lei os jovens portugueses e todos os outros trabalhadores vítimas. A maioria dos empresários só não o faz se de todo não puderem, sabendo-se impunes porque nem a Autoridade para as Condições do Trabalho, nem os governos, nem a justiça, os penaliza. Em vez de fiscalizarem como devem e com a frequência que possa combater atos e a mentalidade esclavagista dos empresários assobiam para o lado e deixam andar. Quando algumas das fraudes e ilegalidades cometidas são denunciadas publicamente assistimos ao jogo do empurra dos diversos organismos reguladores e dos próprios governos. Perante fraudes e crimes públicos, como o que o JN denunciou hoje a PGR fica muda e queda. Ora para o cidadão comum o que é descrito como fraude é crime e se vem a público é a denúncia que perfaz a obrigação de uma investigação àquela moldura penal. Ou não será assim?
E o Fisco o que tem a dizer e a fazer?
Também o fisco deveria explicar como é que o dinheiro que é declarado por pagamento aos estagiários depois volta a entrar nas empresas devido aos estagiários terem a imposição de devolver grande parte daquilo que lhes pertence. Ou essas verbas não entram mais nas contas e vai para o “saco azul”? E isso não é motivo de penalização? Esses empresários, que beneficiam de subsídios do IEFP quando admitem estagiários, perante esta operação fraudulenta não declaram o retorno dessas verbas? E então? Fisco, e então?
Do JN trazemos o trabalho de Rogério Matos que já foi libertado na edição online – hoje de manhã era exclusivo do JN impresso. A complementar também pode ler o que diz uma estagiária de arquitetura, vítima do esquema fraudulento com dinheiros públicos. A jovem resume a exploração a que devido às circunstâncias foi sujeita: "Era isto ou trabalhar de borla".
É espantoso como na humanidade se mantém a mentalidade esclavagista. Neste exemplo específico a denúncia está feita mas tudo vai ficar em águas de bacalhau. A impunidade dos esclavagistas conta com a subserviência e cumplicidade dos governos e dos organismos estatais que têm a obrigação de pôr cobro a tais abusos, a tais fraudes, a tais crimes.
Assim não acontece. Muito provavelmente existem no rol dos infratores, nos escritórios de advogados, “doutos” que fazem parte de partidos políticos do nefasto Arco da Governação e da Corrupção, idem em ateliers de arquitetos – pelo menos nesses de colarinhos brancos, engravatados, com semblantes de respeitabilidade mas que são de facto grandes vigaristas. Esclavagistas da modernidade nas vestes e na aparência dos métodos, contudo, no substancial, são verdadeiros negreiros nas naus de governos que os acolhem e lhes oferecem impunidade, impunidade, impunidade. Caso para considerar: tudo farinha do mesmo saco.
Leia a “pérola” sobre os empresários sevandijas no JN, a seguir.
Mário Motta / PG
Patrões obrigam estagiários a devolver salários
Os estágios profissionais promovidos pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) estão a ser alvo de uma fraude em larga escala.
Ao que apurou o JN, há muitos patrões que não só exigem aos jovens estagiários que lhes devolvam a comparticipação da empresa no salário (que oscila entre 20% e 35%), como ainda lhes impõem que sejam eles a pagar a taxa social única (23,75%) que corresponde à entidade empregadora. Ou seja, dos 691 euros ilíquidos mensais que um estagiário com licenciatura recebe, até 400 podem acabar, por debaixo da mesa, nas mãos dos empresários que os contratam.
Em causa poderão também estar eventuais delitos de natureza fiscal, uma vez que as empresas declaram essas despesas com pessoal, conseguindo os respetivos benefícios em termos de IRC, mas recebem o dinheiro de volta, desta vez sem o declarar ao Fisco. Segundo o presidente do Conselho Nacional da Juventude, o esquema configura pelo menos uma "autêntica lavagem de dinheiro".
Hugo Carvalho confirmou que lhe chegam muitas denúncias, mas admitiu que nenhuma queixa foi formalizada. A explicação é simples: os jovens precisam destes estágios, seja para ter acesso à profissão que escolheram, seja para conseguir algum rendimento, e aceitam a chantagem dos empregadores, acabando por ser, eles próprios, coniventes com o esquema fraudulento.
Contactado pelo JN, o IEFP, organismo que gere a atribuição dos estágios profissionais, e que assegura o pagamento da maior fatia do subsídio (entre 65% e 80%), afirma desconhecer esta prática. Mas salienta, ainda assim, que qualquer entidade empregadora envolvida neste tipo de situação dispõe de um prazo reduzido para promover a sua correção, sob pena de ser obrigada devolver os apoios financeiros concedidos e ficar impedida de aceder a outros. "O IEFP está atento a fenómenos do género que possam ocorrer e apelamos a quem tenha conhecimento de alguma irregularidade, ou seja vítima dela, que a denuncie de imediato aos nossos serviços", refere fonte oficial.
Esta fraude sedimentou-se sobretudo nos setores mais afetados pela crise económica: arquitetura, pequeno comércio, psicologia e advocacia, entre outros. No entanto, e com a exceção da Ordem dos Psicólogos, tanto as ordens dos engenheiros, advogados e arquitetos, como os sindicatos, passando pela Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, ou movimentos de cidadãos como os Precários Inflexíveis, todos afirmam desconhecer esta prática.
Desconhecimento
A Ordem dos Arquitetos, por exemplo, diz não ter qualquer papel na relação entre entidades empregadoras e o IEFP, "nem obtém qualquer informação sobre a atribuição de subsídio à remuneração do estágio". Até junho deste ano, entraram 495 novos profissionais neste setor. Em todo o ano passado foram 833.
O mesmo desconhecimento é partilhado pela Ordem dos Engenheiros, ainda que garanta "condenar e denunciar publicamente qualquer ocorrência de que lhe chegue informação". Até julho deste ano, deram entrada na Ordem 3204 novos membros.
A Ordem dos Advogados passou a permitir que os estágios profissionais dessem acesso à profissão em outubro passado, mas acrescenta que teve o cuidado de proibir expressamente a retenção de qualquer verba por parte dos empregadores. A bastonária, Elina Fraga, mostra-se surpreendida e diz que não chegou ao seu conhecimento qualquer queixa. "Essa prática é completamente ilegal. Se a Ordem tiver conhecimento de que tal acontece em algum escritório de advogados, remete o caso para o órgão disciplinar", frisa. A sanção pode ir desde a mera advertência à expulsão para o prevaricador.
Apenas a Ordem dos Psicólogos conhece bem esta prática e apresenta um plano para a combater: foi criada há três anos uma equipa de trabalho para vigiar as 3500 entidades com quem a Ordem tem acordos para receber estagiários.
Numa situação em concreto, em que uma estagiária foi abordada pela entidade empregadora para devolver a comparticipação suportada pela empresa, foram cortadas as relações com essa empresa. Mas também é verdade que não foi feita qualquer queixa formal junto do Instituto do Emprego e Formação Profissional.
Rogério Matos – Jornal de Notícias
Pagar o estágio: "Era isto ou trabalhar de borla"
Ana conta ao JN que se viu obrigada a pagar o seu estágio de nove meses num ateliê de arquitetura para poder inscrever-se na Ordem dos Arquitetos.
O nome é fictício, mas a história é verídica. "Não há mais nada", atira Ana. "O setor está a passar por dificuldades e eu tenho de obter o título profissional. Era isto ou trabalhar de borla", acrescenta.
Em abril do ano passado, depois de procurar ateliês que a aceitassem e a remunerassem pelo seu trabalho, durante o período de estágio obrigatório para conseguir acesso à Ordem, esta jovem graduada com o Mestrado pela Faculdade de Arquitetura de Lisboa, acabou por desistir e aceitou pagar o estágio do próprio bolso.
No final do primeiro mês de trabalho, entregou ao patrão cerca de 160 euros, que correspondiam à comparticipação da empresa no subsídio de 691 euros ilíquidos. No entanto, e ao segundo mês, o patrão subiu a parada e, para além da devolução da comparticipação do ateliê no subsídio, exigiu a Ana que que pagasse também a taxa social única que corresponde à entidade empregadora (23,75%, ou seja, 164 euros). Após uma curta negociação, Ana acordou com o patrão um pagamento de 300 euros mensais. Se se tiver em conta que Ana teve ainda de pagar os descontos para a Segurança Social e para o IRS, sobrou menos de metade do subsídio inicial. O que não impediu o patrão de lhe apontar "a sorte que tem".
Ao fim de nove meses de estágio, o empregador acrescentou uma última fatura: queria 1500 euros (o equivalente a custos com seguros de trabalho e outras despesas) e Ana, com receio de não receber a minuta para entregar na Ordem, provando a realização do estágio, ponderou pagar. A minuta, no entanto, foi entregue e, até hoje, os 1500 euros não foram pagos.
Ao que apurou o JN, só por este ateliê de arquitetura já passaram pelo menos mais três jovens que pagaram o seu estágio do próprio bolso, em condições fraudulentas semelhantes à de Ana.
Rogério Matos – Jornal de Notícias
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