Luaty Beirão, um dos activistas condenados na farsa angolana por supostos e nunca provados “actos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores” protesta contra a transferência “à força” para o hospital-prisão de São Paulo, em Luanda. Não come e não fala com ninguém.
Esquece-se que estar calado também é um crime. Aliás, para o regime de sua majestade o rei de Angola, qualquer coisa feita por gente que pensa de maneira diferente é crime.
O activista Luaty Beirão terá iniciado hoje uma nova greve de fome, que estará a cumprir sem roupa e em silêncio no hospital-prisão de São Paulo, em Luanda, para onde foi levado “à força” na quarta-feira.
Numa mensagem publicada na página oficial de Luaty Beirão no Facebook, lê-se que o engenheiro foi um de três activistas que se recusaram a ser transferidos da cadeia de Viana para o hospital-prisão – os outros foram Nélson Dibango e Albano Evaristo Bingo Bingo. Um outro preso transferido foi Francisco Mapanda (conhecido como Dago Nível Intelecto), condenado a oito meses de cadeia por ter dito em tribunal que o julgamento dos activistas era aquilo que de facto era: “uma palhaçada”.
“Eu não quero ir para um sítio só porque supostamente tem melhores condições para nós, quando a maior parte dos reclusos vive encarcerado com condições precárias”, terá dito Luaty Beirão, citado na mensagem publicada no Facebook.
Face a esta recusa – e segundo a mesma fonte –, “durante o dia de ontem, 4 de Maio, os serviços prisionais voltaram à comarca de Viana para buscar os outros quatro activistas, levando Luaty Beirão à força para o hospital-prisão de São Paulo”.
“Disseram-nos que ele não quer receber ninguém e que está nu. Não aceitou receber a comida e que está deitado no chão. Não sabemos de mais pormenores”, lê-se na mesma mensagem, que cita uma pessoa identificada apenas como familiar de Luaty.
Ouvida pelo site Rede Angola, a mulher de Luaty Beirão, Mónica Almeida, disse que o activista recusa-se a falar com quem quer que seja.
“Ele foi levado para o hospital-prisão de São Paulo à força. Não sei que força é que eles usaram. Mas ele já tinha dito que não queria ir para a prisão de São Paulo”, disse Mónica Almeida. “Em Viana, ele já denunciava algumas anomalias, como excessos de prisão preventiva e outras situações menos boas a que os presos eram submetidos. Ele não concordava que tinha que ser levado para um sítio diferente dos outros, talvez com melhores condições, quando a maioria dos presos ainda vive em condições precárias”, cita o Rede Angola.
Os familiares de Luaty Beirão dizem que só se aperceberam da transferência para o hospital-prisão quando se dirigiram à cadeia de Viana para lhe entregar uma refeição.
Também em declarações ao Rede Angola, o porta-voz dos serviços prisionais, Menezes Cassoma, disse que ao todo foram transferidos 12 activistas condenados no mesmo processo, e não confirmou nem desmentiu que Luaty Beirão tenha iniciado uma nova greve de fome.
“Eu sei que ontem [quarta-feira] o Luaty foi transferido para o estabelecimento prisão de São Paulo, onde está nesse momento um conjunto de 12 reclusos. Relativamente ao protesto de fome e nudez ainda não posso confirmar”, disse o porta-voz.
O mesmo responsável disse que a transferência foi feita porque os presos se queixavam das condições na cadeia de Viana. “A direcção, tendo em conta que, aquando da passagem deles pelo hospital-prisão de São Paulo, não registou grandes reclamações, optou por detê-los naquele estabelecimento prisional.”
Os 12 activistas a que Menezes Cassoma se referiu foram transferidos da cadeia de Viana para o hospital-prisão de São Paulo na terça-feira, e Luaty Beirão, Nélson Dibango e Albano Evaristo Bingo Bingo terão sido levados quarta-feira – do grupo de 17 constam ainda duas mulheres, Rosa Conde e Laurinda Gouveia, que permanecem cadeia feminina de Viana.
O engenheiro Luaty Beirão foi condenado em Março a cinco anos e seis meses de prisão, juntamente com outros 16 activistas, por “actos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores” – 13 deles foram detidos em Junho do ano passado, durante uma reunião em que debatiam um capítulo do livro Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar Nova Ditadura – Filosofia Política da Libertação para Angola, do professor Domingos da Cruz, também condenado.
Os activistas recusaram sempre as acusações e garantiram em tribunal que os encontros semanais que promoviam visavam discutir política e não qualquer acção de destituição do Governo ou actos violentos.
Folha 8 com Público
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