quinta-feira, 1 de junho de 2017

ANGOLA DEVE REEQUACIONAR AS ABORDAGENS PARA REFORÇAR AS INICIATIVAS DE PAZ


Martinho Júnior | Luanda
  
1- Desde 4 de Abril de 2002 que em Angola se calaram as armas e as políticas de Reconstrução Nacional, Reconciliação e Reinserção Social (integrando os combates à fome, às doenças, ao analfabetismo e à pobreza), estão na ordem do dia com êxitos minguados (se comparados às imensas aspirações nacionais) e em geometria variável.

Está a ser bastante penoso a Angola fugir da cauda dos Índices de Desenvolvimento Humano para os Índices Médios de Desenvolvimento Humano, apesar dos esforços ao longo dos últimos quinze anos de luta contra o subdesenvolvimento no país e isso por causa dos nocivos impactos do capitalismo neoliberal por via do choque, primeiro, depois por via da terapia.

Para além da luta contra o subdesenvolvimento decorrente dessa paz relativa, Angola só pode ser um activo advogado da paz em África, em várias direcções: Golfo da Guiné, África Central, Grandes Lagos e África Austral…

As suas projecções contudo têm falências gritantes enquanto Angola não introduzir uma geoestratégia de desenvolvimento sustentável para o seu próprio espaço nacional (com fulcro na Região Central das Grandes Nascentes, conforme tenho advogado) e não se incluir em pelo menos duas iniciativas que se devem incrementar na África Sub-Sahariana: a “Congo Basin Initiative” e a “Zambezi Basin Initiative”, que poderão melhor aglutinar os esforços comuns a partir do espaço SADC, no sentido de melhor equacionar as aproximações e abordagens em relação às regiões dos Grandes Lagos, à “Niger Basin Initiative” e à “Nile Basin Initiative”, onde Angola deveria ser pelo menos país observador.

As abordagens angolanas carecem das componentes de análise dos factores antropológicos, de forma a melhor compreender as divisões, tensões e conflitos (e assim trabalhar por via da lógica com sentido de vida e da paz), ao mesmo tempo que carecem de abordagens físico-geográficas-ambientais que traduzam a interpretação correcta da dialéctica entre as regiões desérticas ou semi-desérticas e as regiões tropicais ou equatoriais, para além das abordagens históricas, sociológicas e outras que se deveriam fazer (como por exemplo a constante análise das tendências migratórias dentro do continente e as razões dessas migrações humanas, que se têm intensificado sob os impactos do capitalismo neoliberal e dos decorrentes fenómenos de tensões, conflitos e guerras).

A norte Angola deveria privilegiar as relações com a Nigéria e com o Egipto, tendo em conta os seus papeis geoestratégicos nas suas regiões, com o Egipto também por causa do potencial papel na “rota da seda” para dentro de África.

2- Sendo imprescindível a formulação das iniciativas em relação ás bacias do Congo e do Zambeze, Angola não pode esquecer que com fulcro na sua Região Central das Grandes Nascentes, fluem seis caudais importantes:

- Os caudais do Cuango e do Cassai, afluindo ao Congo a norte;

- Os caudais do Luena, Luanguinga, Lungué Bungo e Cuando, afluindo ao Zambeze a leste.

A compreensão da necessidade de integração de Angola quer na “Congo Basin Initiative” (à espera de formação) e na “Zambezi Basin Initiative” (ainda em formação embrionária), inibe a compreensão da importância em Angola do fulcro que constitui a Região Central das Grandes Nascentes, matriz da água interior, assim como da importância das outras bacias hidrográficas: Cubango (Okawango), Cuvelai, Cunene, Catumbela, Queve, Longa e Cuanza, as cinco últimas decisivas para a maior densidade de ocupação do território nacional num triângulo com base em toda a costa do Atlântico e vértice precisamente na Região Central das Grandes Nascentes (conforme sínteses-analíticas anteriores de minha autoria).

3- Se Angola providenciar, em reforço de suas políticas geoestratégias de paz em África, a sua presença como observador nas instituições referentes aos Grandes Lagos, e às bacias do Nilo e do Níger, Angola poderá reforçar sua capacidade inteligente de interpretação corrente dos fenómenos físico-geográficos-ambientais correlacionados com os fenómenos humanos, o que irá enriquecer as abordagens múltiplas e multi sectoriais que há a realizar em reforço das iniciativas geoestratégicas de paz.

Angola deve levar em conta que não será com interpretações de carácter elitista que poderá aprofundar conhecimentos e convencer; por isso as trilhas indexadas à hegemonia unipolar e aos expedientes de capitalismo neoliberal, tendo em conta a história de África desde o século XIX, trilhas que se afiguram menos apropriadas ou mesmo contraproducentes.


A trilha da emergência multipolar, perseguindo uma lógica com sentido de vida nos termos duma globalização inclusiva, afigura-se muito mais coerente com as aspirações de paz e luta contra o subdesenvolvimento, pois até os processos de mercado “win-win”, não tocando nas questões de carácter sócio-político, dão outra desenvoltura às capacidades a instalar a partir dos “soft power”decisivos, inibindo as pretensões neocoloniais.

Angola sendo pois uma notável charneira, tem em aberto opções pacientes a fazer, por vezes com o risco de serem opções contraproducentes, mas com possibilidades de correcção se a noção em prol dum desenvolvimento sustentável com base numa geoestratégia baseada nas correlações que acima indico (fenómenos físico-geográficos-ambientais correlacionados com os fenómenos humanos), forem adoptadas numa visão para todo o continente, enquanto diapasão-reitor da orientação.

Ainda não está formado um núcleo duro em Angola, capaz de alicerçar as visões geoestratégicas inteligentes mais arrojadas em benefício da paz, da luta contra o subdesenvolvimento, do aprofundamento da democracia e isso passa pela compreensão total do que se passa por inteiro em todo o continente-berço da humanidade, com abordagens que observam os fenómenos do geral para o particular e nunca perdendo de vista a dialéctica em que esses fenómenos ocorrem! 

Ilustrações: A visão geoestratégica necessária para o continente africano no seu todo; As quatro maiores bacias hidrográficas de África e os Grandes Lagos, o maior tesouro africano; A bacia geoestratégica do Congo, de que Angola faz parte com as bacias do Cuango e do Cassai; A bacia geoestratégica do Zambeze e o Grande Lago Niassa com foco em Moçambique).

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