inha dez anos no 25 de Abril. Do fascismo nada sabia. Mesmo coisas que se passavam lá por casa e às quais eu era nitidamente "poupado". Só depois da Revolução soube que o meu tio Victor tinha vivido escondido, para não ser preso, na cave do prédio onde habitávamos. Ou que o meu irmão Henrique tinha sido expulso por motivos políticos do Liceu D. Manuel II. Nem entendia a razão pela qual o carteiro nos tinha alertado de que "podíamos ser presos", quando o meu amigo Jorge trouxe dezenas de autocolantes redondos, de cores berrantes, que diziam "basta" a várias coisas - e que tinha encontrado no chão da "Praça" quando vinha com a mãe, que trabalhava lá no prédio. Sabia que o meu irmão Tocas, sempre que havia manifestações, tinha tendência a ser detido - mas isso apenas me fazia querer pertencer aos "estudantes" contra os polícias, nas nossas brincadeiras. Tinha ouvido falar de um tal de "Palma Inácio", que tinha sido preso, mas, entendendo que ele era "bom", não sabia os motivos da sua prisão. E muito menos entendi as razões pelas quais o meu pai me disse para bater palmas apenas com os dedos indicadores quando lhe disse que todos os meninos da minha escola iam aplaudir o presidente Américo Thomaz, que ia inaugurar as novas instalações do Instituto de Cegos.
Foi com esta inocência que no dia 25 de Abril de 1974 fui para a Escola Gomes Teixeira. No mesmo dia em que o meu irmão Henrique ia para o Liceu Garcia de Orta de fraque e cartola porque uns alunos tinham sido castigados por irem com roupa "pouco digna"... Naquela altura, não tínhamos televisão em casa. E não era costume ouvir rádio àquelas horas da manhã.
A normalidade desse dia começou a ser posta em causa quando muitos pais começaram a ir buscar os filhos. Sem que ninguém nos dissesse porquê. Até que, já éramos poucos os que lá estavam, um professor nos disse que em Lisboa uns militares se tinham revoltado contra o Governo. Lá fui para casa, sem saber se aquilo era bom ou mau. Em frente ao Liceu D. Manuel II, constatei que os estudantes se amontoavam no espaço em frente ao liceu, que me parecia fechado, o que aumentou a minha apreensão. Mas, chegado ao prédio onde vivia, outro caso verdadeiramente anormal: a janela escancarada e o meu pai à janela! Olhei para ele e nunca mais esquecerei o sorriso com que me olhou. Pelo conforto que me transmitiu e, soube-o a partir daí, porque o 25 de Abril era uma coisa "boa"!
Do fascismo nada sabia. Só após a Revolução soube que o meu tio Victor tinha vivido escondido, para não ser preso. E não entendi por que o meu pai me disse para bater palmas apenas com os dedos indicadores, quando lhe disse que o Américo Thomaz ia à minha escola...
*Engenheiro
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