quinta-feira, 16 de junho de 2016

Perfil de um Presidente da República para São Tomé e Príncipe 2016 – 2021


- Breves notas constitucionais
- Que Presidente da RepúblicaNÃOPRECISAMOS?
- Que tipo de PR precisamos?
- Conclusões

Olegário Tiny – Téla Nón, opinião

NOTA PRÉVIA
O presente artigo não pretende ser um artigo de escola, meramente teórico, sobre os poderes do Presidente da República na Constituição Politica de STP em vigor (Lei n. 1/2003). Trata-se de uma reflexão pessoal, de índole essencialmente política, ancorada nos preceitos constitucionais, e “calejada” pela prática constitucional desastrosa e geradora de uma persistente instabilidade política e governamental nos últimos 25 anos. Através dos meus pontos de vista, pretendo contribuir de forma tão simples quanto possível, para que o cidadão comum possa melhor entender o papel do PR no nosso sistema constitucional. 

1 – BREVES NOTAS CONSTITUCIONAIS

São quatro os órgãos de soberania consagrados na Constituição Politica são-tomense: Presidente da República, Assembleia Nacional, Governo e os Tribunais. Esses órgãos de soberania devem observar os princípios de separação e interdependência dos poderes. Tal significa que todos os órgãos estão dotados de poderes que lhes permitam interagir com cada um e todos os outros.

(Art. 77 e seguintes da Constituição Política da RDSTP)

Funções / competências do PR

“O Presidente da República é o Chefe do Estado e o Comandante Supremo das Forcas Armadas, representa a RDSTP, garante a independência nacional e a unidade do Estado e assegura o regular funcionamento das instituições”.

O PR é eleito para um mandato de 5 anos, podendo ser reeleito uma vez, através de sufrágio directo, secreto e universal.

Compete-lhe defendera Constituição da Republica.

Para além das competências“condicionadas” relativas, por um lado, à nomeação (tendo em conta os resultados eleitorais), exoneração e demissão do Primeiro Ministro e membros do Governo, e por outro lado, à dissolução da Assembleia Nacional, o PR tem ainda o poder de representação do Estado nas relações internacionais.

Por outro lado, o PR tem, dentre muitos outros, o poder de promulgação e veto dos diplomas legais produzidos pela Assembleia Nacional e pelo Governo (art. 83º).

2 – CONTEXTO NACIONAL ACTUAL

O país encontra-se numa encruzilhada. Está dividido e sem rumo certo.

CERTO é que o povo está cansado de promessas quiméricas (de sonho), esgrimidas de forma demagógica (com intenções de enganar o povo), quase semprecom o objectivo de acomodar e confortar estratégias pessoais e de grupo; essas promessas servem em regra ambições e apetites mal disfarçados e profundamente prejudiciais ao desenvolvimento sustentável deste país.

O país de há muito precisa mudar de página e definir rumo novo; decerto que não a caminho de um Dubai, tão longínquo em todas as suas vertentes, mas sim de um STP genuíno, moderno, ancorado nas suas raízes e na sua cultura de DIÁLOGO, ENTENDIMENTO MÚTUO E RESPEITO pelos seus concidadãos;essa CULTURA é na sua essência boa, positiva, é mestiça e rica e é nossa; por isso, deve ser acarinhada por todos quantos amam São Tomé e Príncipe. Decerto carece de evolução e de aperfeiçoamentos ao longo da nossa caminhada, que se quer com acerto e em harmonia, no respeito pela diferença e pelos valores democráticos, arduamente conquistados pelo povo santomense.

É neste contexto que enfrentamos um novo e ingente desafio, que são as eleições presidenciais em 17 de Julho próximo. Fazer face a este desafio exige uma reflexão profunda e séria de todo o cidadão consciente, em torno de algumas questões fundamentais, a saber:

Para que serve um PR na actual conjuntura que o país atravessa?

Qual o seu papel no EQUILÍBRIO E NA PACIFICAÇÃO INSTITUCIONAL e política que o país tanto precisa?

Será (ou deverá ser) o PR no nosso sistema político-constitucional um (quase)corta-fitas?

Vejamos pois:

3 – Que tipo de PR NÃO precisamos (em termos de atitude) 

O povo são-tomense não precisa de um PR que faça de conta que existe, que aja por impulso, ou seja, um PR sem Visão, nem agenda estratégica, nem iniciativa própria;

Não queremos nem precisamos de um PR, que não tenha conhecimentos e competência científicas suficientes, nem cultura de diálogo democrático.

No actual quadro constitucional adoptado desde a MUDANÇA em 1991, não necessitamos de um PR que queira governar directa ou indirectamente (golpista disfarçado), pretendendo substituir-se ao Primeiro Ministro, chefe do Governo. Por outro lado,a Nação dispensa, de igual modo, um Primeiro Ministro que se subordine às vontades do PR – um sobe só ou um banana;

Por outro lado, dispensamos de bom grado um PR que se molde às necessidades ou vontades de um qualquer Primeiro Ministro (um pau mandado);

Outrossim dispensamos um PR que esteja interessado em pescar sistematicamente em águas turvas; e/ou que esteja interessado em manipular para levar a água ao seu moinho, realizar estratégias camufladas para as quais não fora eleito, tais como criar mais um novo partido político, com o mero objectivo de se perpetuar no poder, por si próprio ou através do seu grupo ou partido, de amigos ou sócios de qualquer espécie; demonstra a nossa experiência política à saciedade, que tais comportamentos não só não trouxeram mais valias para o sistema, como também introduziram factores de instabilidade política e governativa, cujas consequências negativas ainda hoje o país vai sofrendo.

Nem tão-pouco precisamos de um PR disponível para promover ou proteger interesses ligados a negócios obscuros, quiçá ligados ao trafico ilegal de substancias proibidas de toda a espécie, desde a droga e armas, passando pelos produtos derivados de pirataria marítima, como opetróleo bruto, até aos negócios relacionados com o branqueamento de capitais(tudo dinheiro sujo de sangue).

4 – Afinal, Que tipo de PR precisamos?

em termos de atitude, Liderança e solidariedade institucional 

Precisamos de um verdadeiro líder que saiba ser árbitro independente e seja sério, competente, dinâmico, comunicativo e pró-activo; o PR, para além de uma base científica sólida, seja em que área for, deve ser profundo conhecedor dos preceitos e princípios que enformam a nossa Constituição;

Um líder que respeite na integra as competências constitucionais do Governo, e demonstre na atitude e no comportamento, disponibilidade permanente de diálogo e busca de consensos e entendimentos possíveis para o desenvolvimento de acções em prol das grandes causas nacionais;

Um PR que promova os princípios de Boa Governação, transparência, equidade e igualdade de oportunidades…

E se empenhe no combate consistente à corrupção, mediante a busca de parcerias pertinentes com os órgãos judiciais e policiais competentes;

Precisamos de um líder que eleja a liberdade de imprensa e a defesa de um ambiente sustentável, dentre as bandeiras prioritárias da sua acção…

E faça sentir todo o seu peso na prestação da solidariedade institucional em favor da afirmação de uns TRIBUNAIS, onde a independência passe a rimar com competência, estrita legalidade, celeridade e igualdade dos cidadãos perante a lei;

Em suma precisamos de um PR que, a um tempo, participe com inteligência, próactividade e moderação quanto baste, na gestão global do país, cingindo-se porém aos  limites que a Constituição e as leis lhe impõem; e que exerça com mestria e imaginação suficientes a chamadamagistratura de influência;

Nesta perspectiva, teríamos um PR cujo fito permanente seria garantir a coesão do Estado.

Em termos de Comportamento e ética – precisamos de um PR 

Que seja transparente  em toda a sua acção política;

Que promova os bons valores, princípios e costumes, nomeadamente os da família, do trabalho honesto e da disciplina, como base de uma sociedade equilibrada e preparada para promover o desenvolvimento sustentável.

Que de forma equilibrada tenha a coragem de recolocar os pontos nos “Is”, sempre que os seus poderes constitucionais realmente o exijam ou permitam;

Precisamos de um PR que seja de todos e de ninguém, ou seja: que uma vez eleito, se coloque acima dos interesses partidários ou de quaisquer grupos, se preocupe de igual modo com todos os santomenses, no país ou na diáspora, e não seja mandatário de interesses particulares ou de grupos específicos;

Para as funções de PR o povo são-tomense necessita antes de mais um verdadeiro líder, a um tempo moderado, moderador, mobilizador e chefe, (ele é, como vimos atrás, o Comandante Supremo das Forças Armadas e o Representantedo Estado nas Relações Internacionais);precisa-se enfim de um bom e verdadeiro árbitro.

O acervo de poderes que a Constituição lhe confere, permitem que se possa ter um titular do cargo forte, dinâmico e de grande utilidade e relevância na condução dos assuntos mais relevantes da Nação, em cooperação constante e na busca dos CONCENSOS possíveis com os outros órgãos de soberania, nomeadamente o Governo e a Assembleia Nacional, com base nos princípios da separação e interdependência dos poderes dos diversos órgãos de soberania (art. 69º).

4 – CONCLUSÕES 

Só serve ou deveria servir para PR quem tem as necessárias  competências, habilidades, coragem e vontade política genuína de BEM SERVIR OS LEGÍTIMOS DESIGNIOS DESTE POVO, em detrimento de quaisquer outros interesses que não se coadunem com estes.

Por outro lado, não pode servir os desígnios nacionais ou os interesses de todos nós, um PR (ou candidato a tal cargo), que se proponha no essencial, ou que seja suposto ser uma mera figura representativa de um qualquer chefe de partido ou de Governo.

Um Presidente da República não deve ser eleito com o objectivo confesso de servir as políticas e os interesses de um ou mais partidos políticos ou de qualquer Governo, pois tal constituiria violação grave da letra, do espírito e dos princípios constitucionais vigentes em São Tomé e Príncipe.

De resto,no sistema constitucional semi-presidencialista que é o nosso, o Primeiro Ministro e chefe do Governo já não tem que ter medo do PR, ao contrário do que acontecia até a ultima revisão, que deu azo à presente Constituição – Lei 1/2003. Ou seja, o sistema semi-presidencial de pendor Presidencialista,adoptado na Constituição de 1990, que permitiu durante cerca de 15 anos aos Presidentes Miguel Trovoada e Fradique de Menezes, dissolver a Assembleia Nacional e demitir Governos, com base em critérios, no mínimo muito duvidosos e nada consistentes, foi ceifado dos seus principais factores de instabilidade, com a revisão de 2003.

O sistema perdeu o seu pendor Presidencialista, mediante a consagração de poderes maismoderados ao PR (em relação ao Governo e à Assembleia Nacional), reduzindo significativamente os poderes quase arbitrários que ele detinha, em relação à demissão do PM (agora apenas com o parecer favorável do Conselho de Estado), e à presidência do Conselho de Ministros (outrora, sempre que o PR o entendesse, hoje só mediante convite do PM); e bem assim, em relação ao poder de dissolução da Assembleia Nacional, para o qual se passou igualmente a exigir o parecer favorável do Conselho de Estado.

Embora o Governo seja responsável perante o PR e a Assembleia Nacional, os poderes do PR estão hoje mais mitigados, mais equilibrados, sugerindo/exigindo aos dirigentes dos órgãos de soberania maior sabedoria, cooperação institucional e espírito democrático mais apurado, para a busca de soluções a bem da Nação. Embora se vislumbre aqui e ali a necessidade de aperfeiçoamento do sistema, ele apresenta-se já despido dos atrás referidos factores de instabilidade, permitindo uma cooperação institucional, a meu ver, perfeitamente aceitável.

Ao terminar, não resisto à tentação de remeter todos os que duvidam das virtualidades do nosso regime constitucional vigente, seja por desconhecimento ou por opção, seja por falta de espírito democrático ou má fé, ou qualquer outra razão, de os remeter, dizia, aos excelentes exemplos que temos bem perto de nós, nas pessoas dos Presidentes da República José Carlos Fonseca e Marcelo Rebelo de Sousa, respectivamente de Cabo Verde e de Portugal.

Estes são bons exemplos de pessoas com visão e competência técnica e política e amor à pátria, cujos sistemas constitucionais lhes consagram poderes relativamente mais moderados do que o são-tomense, mas que demonstram não precisar de demasiados poderes para terem um desempenho de excelência ou próximo disso. Por outro lado, no caso de Portugal, igualmente se demonstra, pelos sinais já lançados (bodylanguage), que não é indispensável ter-se um PR membro ou simpatizante do partido do Governo, para que se construa a estabilidade política e governativa no país. Essa estabilidade depende muitíssimo mais da postura e da atitude dos líderes políticos com funções mais relevantes no país em cada momento, designadamente, nas suas vontade e habilidade de criar bases de entendimento e busca de consensos em matérias essenciais a todos nós.

Sendo conhecido o provérbio português, “quem semeia ventos colhe tempestade”, não será de estranhar que todo o dirigente ou líder político, que passe boa parte do seu tempo útil semeando discórdias, desavenças, perseguições e provocações de todo o tipo, fique depois refém dos seus próprios anseios e medos.

É minha convicção profunda que todo o dirigente político que dê primazia à geração de quezilhas, em vez de entendimentos; à birras em vez de construção da paz; esse dirigente pode ser CHEFE de qualquer coisa ou grupo, mas não é um verdadeiro LIDER, cujo exemplo deva ser emulado (imitado) e seguido sobretudo pelas gerações mais jovens.

Todavia, um PR que queira dignificar o seu cargo tem de se abster, enquanto verdadeiro árbitro, de todo o tipo de questiúnculas e exercer com independência as altas funções que lhe são cometidas pela Constituição e demais legislação nacional.  Um bem haja a todos os cidadãos de boa vontade deste nosso São Tomé e Príncipe!

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