Victor Carvalho – Jornal de Angola, opinião
As questões que envolvem o tema relacionado com a liberdade de imprensa são apaixonantes e motivadoras de discussões temáticas onde são esgrimidos diversos tipos de argumentos.
Uns motivados por ideologias políticas, outros por frustrações profissionais próprias de uma classe que faz da inquietude a sua grande motivação profissional, e ainda outros que a utilizam como arma de arremesso para subverter vontades e decisões que não se enquadram nas suas estratégias ou da daqueles que os utilizam sem qualquer tipo de pudor.
No grupo destes últimos estão entidades e personalidades internacionais, aparentemente insuspeitas, mas que não hesitam em usar recursos e métodos de persuasão para a aquisição das cumplicidades que lhes possibilitem a conquista dos seus objectivos.
Nas páginas deste jornal foi recentemente publicada uma pequena entrevista com o padre Quintino Candanje onde ele, respondendo a uma pergunta do jornalista Gabriel Bunga, afirmou que a estação de que é director, a Rádio Ecclesia, teria de devolver determinada verba que lhe teria sido atribuída pela União Europeia, por se ter recusado a cumprir um protocolo de cooperação que, no seu entender, previa uma série de acções inseridas num determinado plano gizado para “derrubar o poder actual em Angola”.
Foi uma declaração forte, mas peremptória, feita ao abrigo da liberdade que o padre Candanje tem de se exprimir para, como homem de fé, denunciar verdades por muito que estas possam magoar determinadas entidades, neste caso a União Europeia, que está entre os que se julgam acima de todas as suspeitas.
Numa “nota de esclarecimento” enviada às redacções, a delegação da União Europeia em Luanda confirmou a existência desse protocolo e a atribuição de uma verba à Rádio Ecclesia para o cumprimento de um não especificado projecto. Os bispos da CEAST, na sua vocação conciliatória, emitiram por sua vez um comunicado onde apelaram à ponderação, ao diálogo e à concórdia para solucionar o problema.
Ou seja, o exercício da livre expressão, que este jornal sempre defendeu, permitiu que todos nós soubéssemos que a União Europeia financiou, de facto, um projecto da Rádio Ecclesia e que este se destinava, de algum modo, a “facilitar” o seu trabalho.
Foi também o direito dessa mesma expressão, e provavelmente esse tal compromisso para “facilitar” o trabalho da estação, que permitiu à deputada europeia Ana Gomes, de nacionalidade portuguesa, na sua última visita ao país, usar em directo os microfones da Ecclesia, como se estivesse em Bruxelas, para desferir um forte ataque contra a soberania nacional, acompanhado depois de um apelo um pouco mais discreto para que houvesse uma maior contundência nas posições da emissora contra o Executivo, conforme também teve oportunidade de esclarecer o prelado, agora em declarações livremente prestadas à Rádio Nacional.
E, aqui chegados, a grande questão que se coloca é de se saber se não estará a mesma União Europeia a financiar outros projectos de comunicação social em Angola, igualmente destinados a “facilitar” a realização de determinada missão por parte de pessoas “mais disponíveis” que o padre Candanje?
Numa altura em que a liberdade de imprensa continua a ser um tema de discussão nacional, motivando até algumas forças políticas a realizarem conferências para se lamentarem da forma como são tratados por “certos” jornalistas, o episódio que envolve o director da emissora católica e a União Europeia volta a trazer à superfície a questão que envolve a denúncia repetidamente feita, por parte das autoridades nacionais, da existência de uma campanha internacional de difamação contra Angola.
De facto, os sinais de que essa campanha existe e que está em marcha cada vez mais acelerada, pese o modo displicente e nalguns casos até comprometedor como as denúncias são contestadas por parte de determinadas forças colectivas e individuais, começam a multiplicar-se e levaram já o próprio ministro das Relações Exteriores a garantir que as autoridades estão atentas, sabem o que se passa e a afirmar que serão tomadas as medidas diplomáticas adequadas para denunciar e travar essa orquestração que está em marcha para denegrir a imagem do país.
Muitas organizações nacionais e internacionais que actuam em Angola, ao abrigo de programas especialmente direccionados para uma suposta “promoção da democracia e da defesa dos direitos humanos”, mais não fazem do que uma descarada ingerência nos assuntos internos do país, movimentando-se numa quase marginalidade legal cujos perigosos efeitos começam agora a se vislumbrar de forma muito mais clara.
Esses programas, estabelecidos num secretismo que lança a suspeita sobre quem neles participa, podem enquadrar-se bem num plano mais vasto que engloba também alguma imprensa internacional, muito recatada quando trata os assuntos internos dos seus países, mas especialmente ousada, arrogante e até caluniadora quando aborda o que se passa em Angola.
As medidas diplomáticas prometidas pelo ministro das Relações Exteriores são urgentes e pertinentes, tal a gravidade que envolvem essas tentativas de desestabilização, mas precisam de ser devidamente complementadas com reacções práticas de denúncia e de repúdio, como agora fez o padre Quintino Candanje que está quase a ser crucificado por ter assumido a verdade, para que se saiba que os angolanos estão atentos e prontos a usar a lei e a sua liberdade de expressão para defenderem a sua soberania e o direito que têm em serem donos do seu futuro.
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